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Diagnósticos e Prescrições de Enfermagem: recriando os instrumentos de trabalho[1]

[1] Publicado em Texto e Contexto, v.4, n. 1, p. 160-69, jan/jun., 1995

 Isabel Cristina Fonseca da Cruz

            Resumo. Este estudo  tece considerações sobre  as  atividades  de  enfermagem (diagnóstico e prescrição) com base  na  literatura  profissional. A taxonomia sobre essas atividades são apresentadas como uma recriação dos instrumentos de trabalho da enfermeira. Conclui-se que estas atividades podem ser úteis  na  definição  do objeto de trabalho da enfermagem. Sugere-se estudos  de  validação das propostas.

            Unitermos: Diagnóstico de enfermagem, classificação

            Introdução

            Entre os diversos instrumentos que podemos  utilizar  para  o exercício profissional, temos o processo de enfermagem. O processo de  enfermagem  e  o  método  preconizado  para  implementação  da assistência. Ha uma tendência mundial em estabelecer como tripé da pratica profissional o diagnóstico, as prescrições e os resultados dessas prescrições (client outcome). Essa tendência caminha para a construção de taxonomias de enfermagem que organizam os fenômenos com os quais lidamos profissionalmente (CLARK; LANG, 1992; BULECHECK; McCLOSKEY, 1992). 

            O nosso interesse pelo  processo  de  enfermagem  começou  em decorrência da  dificuldade em organizar  e  sintetizar  os  dados significativos sobre o cliente e nomeá-los de uma forma que  fosse própria e especifica para os enfermeiros (CRUZ,  1989).  Estudamos então uma estratégia dirigida para a formulação  dos  diagnósticos de enfermagem e o desenvolvimento da habilidade  sobre  julgamento clinico (CRUZ, 1993).

            Durante a realização das pesquisas anteriormente citadas, percebemos  que  ao formular um diagnóstico  de enfermagem, se este ficasse desvinculado de uma ou mais prescrições, ou voltadas para o seu reforço (diagnósticos de bem-estar)  ou  sua  resolução (alterações no padrão de resposta humana), o diagnóstico não passava de  um  mero exercício intelectual.

            Na literatura profissional, verificamos que a  sistematização da assistência, incluído nessa sistematização o  diagnóstico  e  a prescrição, inicia-se no Brasil com as pesquisas da Dra. Wanda  de Aguiar Horta.

            O modelo conceptual de  Wanda  Horta  ainda  hoje  influencia fortemente os enfermeiros, conforme pudemos constatar  (UTYAMA  et al, 1990). Entretanto, a implementação do  seu  modelo  conceptual não observa a  correlação  de  suas  principais  fases,  ou  seja,  histórico, diagnóstico, prescrição e resultado. Esta  ausência  de correlação e, em nosso entendimento, um dos  fatores  responsáveis pela  resistência  entre  os   profissionais   à   utilização do método do processo de enfermagem enquanto um instrumento de trabalho a ser utilizado em seu cotidiano profissional.

            Ainda que neste estudo não pretendamos tecer considerações sobre o  processo de enfermagem, seus possíveis modelos e utilização, entendemos ser importante explicitar que o modelo por nós adotado possui  quatro  etapas, a saber: o histórico, o diagnóstico, a prescrição  e o resultado.  Destacamos   para   nossa discussão o diagnóstico e a prescrição  de  enfermagem,  tendo  em vista que as pesquisas em  desenvolvimento  que  propõem  a  criação  de taxonomias que venham ajudar a enfermeira no exercício de sua prática.

            Diagnósticos de Enfermagem

            O termo diagnóstico de enfermagem  surgiu  na  literatura  na década de cinqüenta e, ate os anos  setenta,  foi  aplicado  muito raramente (TURKOSKI, 1988; CRUZ, 1990; FARIAS et al,  1990;  CRUZ; CRUZ, 1991).

            Um conflito existente quanto ao uso da palavra diagnóstico que se pensava ser de propriedade da medicina pode ter atrasado o desenvolvimento de nossos diagnósticos enquanto fenômenos do âmbito exclusivo da enfermagem. Como consequência desse conflito, o diagnóstico, enquanto etapa do processo de  enfermagem,  ou não o integra totalmente ou e substituído por sinais,  sintomas  e equipamentos, entre outros elementos, nas instituições onde  ha  a sistematização   das   atividades   de   enfermagem   (CAMPEDELLI; GAIDZINSKY, 1987; UTYAMA et al, 1990).

            No sentido de utilizar uma terminologia específica para a enfermagem, encontramos nos trabalhos  de  NOBREGA (1991) e ZANETTI et al (1992) relatos sobre  a  aplicabilidade  do modelo  de  processo  de  enfermagem  proposto  por  Wanda   Horta associado a um modelo de diagnóstico que tem por base a  Taxonomia I da NANDA (NORTH AMERICAN NURSING DIAGNOSIS ASSOCIATION).

            A vinculação do diagnóstico  a  prescrição  de  enfermagem  é ressaltada por KIM et al (1982)  que  consideraram  o  diagnóstico como um termo resultante de um problema derivado do histórico  que exige ações e objetivos específicos. Vinculam-se indissociavelmente, o  diagnóstico  a  prescrição  de  enfermagem, tendo em vista que a identificação por parte da enfermeira de uma situação ou problema do cliente/família/comunidade exige a contrapartida de seu serviço e fugir a essa responsabilidade configuraria um crime ético.

            Neste estudo adotamos a definição da NANDA sobre  diagnóstico de  enfermagem  (NORTH  AMERICAN  NURSING  DIAGNOSIS  ASSOCIATION, 1990). De acordo com essa definição diagnóstico de enfermagem é:  

                        "Um  julgamento   clinico   sobre   as respostas do indivíduo, da família  ou  da comunidade aos processos  vitais,  ou  aos problemas de saúde atuais ou potenciais, o qual fornece a base  para  a  seleção  das prescrições  de  enfermagem,  e   para   o estabelecimento de resultados, pelos quais  o enfermeiro e responsável."  

            A análise dessa definição mostra um aspecto  que  merece  ser ressaltado, como, por exemplo:  a  especificação  do  fenômeno  de interesse do enfermeiro, isto é, a resposta do cliente ao processo vital ou ao problema de saúde. O enfermeiro  tem  como  centro  de interesse a reação ou o comportamento  do  cliente  diante  de  um problema de saúde ou processo vital como seu objeto  de  trabalho. São essas  reações  ou  respostas  que  compõem  a  taxonomia  dos diagnósticos  de  enfermagem.  Os  diagnósticos,  por   sua   vez, descrevem  as  áreas   independentes   da   enfermagem,   não   as interdependentes (WARREN et al, 1990).

            Por essa definição de diagnóstico de enfermagem, o objeto  de trabalho do enfermeiro não e o problema de saúde em  si  (MITCHELL et al, 1991), mas a resposta do indivíduo ao problema.

            Por  essa  definição   ainda,   o   diagnóstico   encontra-se obrigatoriamente vinculado a prescrição, servindo de base para sua escolha, estando  também  associado  ao  resultado  obtido  com  a implementação da prescrição.

            Segundo YOSHICA et al (1993), o resultado da assistência deve ser previamente estabelecido por meio de critérios  ou  objetivos. Essa fase do processo de  enfermagem  constitui  a  avaliação.  No âmbito deste estudo, porem, não abordaremos os resultados  (client outcomes)  desejados  para  o  cliente  vivendo  com   hipertensão arterial. Trataremos apenas de duas atividades  de  enfermagem:  o diagnóstico e a prescrição.

            No Brasil, encontram-se numa fase emergente os estudos  sobre as      atividades      de      enfermagem      referentes      ao diagnóstico-prescrição-resultado. Entretanto, com a  evolução  das pesquisas   relacionadas   a   criação   de   uma    classificação internacional sobre a pratica de enfermagem (CLARK;  LANG,  1992), deverão crescer as referencias a essa  temática.

            Na  medida  em  que  os  estudos  sobre  os  diagnósticos  de enfermagem se desenvolveram, revelaram paralelamente uma serie  de fenômenos ou respostas que apresentavam relação entre si,  podendo ser categorizados por classes. Surgiu então a necessidade  de  uma taxonomia para os diagnósticos de enfermagem.

            Como conseqüência da utilização da taxonomia de  diagnósticos surgiu a necessidade de se estudar as prescrições.  Esses  estudos deram  origem  a  classificação  das  intervenções  de  enfermagem (BULECHECK; McCLOSKEY, 1992).

            Em 1989, na Coréia do Sul, durante o Congresso  Internacional de  Enfermagem,  foi  aprovada  a  proposta  de  criação  de   uma classificação   internacional   para   pratica    de    enfermagem (International Classification for Nursing Practice -  ICNP).  Esse projeto esta sendo conduzido pelo International Council of Nursing - ICN.

            As classificações referentes  a  diagnósticos  e  prescrições deverão futuramente compor  uma  única,  denominada  Classificação Internacional  da  Pratica  de  Enfermagem  (CLARK;  LANG,   1992; BULECHECK; McCLOSKEY, 1992), a ser anexada ao Código Internacional de Doenças (CID) da Organização Mundial de Saúde (OMS) (WARREN  et al, 1990).

            Dentre outros benefícios dessa classificação internacional de enfermagem, destacamos a organização de dados  e  informações  que servirão de base para as decisões clinicas (CLARK; LANG, 1992).

            Os estudos sobre a classificação das atividades de enfermagem têm congregado enfermeiros de diversas nacionalidades, uma vez que a necessidade de definir os  fenômenos  que  cabem  ao  enfermeiro diagnosticar, tratar e avaliar e universal.

            No Brasil, já existem, desde 1987,  Grupos  de  Interesse  em Diagnósticos de Enfermagem (GIDE)  utilizando  a  Taxonomia  I  da NANDA como  referencial  para  a  denominação  do  diagnóstico  de enfermagem (CRUZ et al, 1991; NOBREGA et AL, 1992;  CRUZ,  et  al, 1992) e iniciando  os  estudos  sobre  prescrições  de  enfermagem (PEREZ et al, 1990; SILVA; NOBREGA, 1992).

            Prescrições de Enfermagem

            A  prescrição  de  enfermagem  é  definida   por   BULECHECK; McCLOSKEY (1992) como qualquer cuidado  direto  que  a  enfermeira realiza em beneficio do cliente. Esse  cuidado  direto  inclui  os tratamentos iniciados pela enfermeira,  os  tratamentos  iniciados pelo medico e a realização de atividades diárias essenciais para o cliente."

            No que se refere a prescrição de  enfermagem,  verificamos  a existência de uma infinidade de termos utilizados como  sinônimos, entre os quais destacamos  intervenção  e  cuidado  de  enfermagem (YOSHICA et al, 1993).

            Neste estudo, utilizamos a expressão prescrição de enfermagem por considerarmos não só adequada, como também em consonância  com a legislação vigente (BRASIL, 1986).

            Reafirmamos que todo diagnóstico deve ser vinculado  a,  pelo menos,  uma  prescrição.  Contudo,  não  ha  reciprocidade   nessa afirmativa,  pois  nem  toda  prescrição  de  enfermagem  tem  por finalidade a resolução ou reforço de um diagnóstico. Isto porque o foco da prescrição e a ação do  enfermeiro;  ação  realizada  para ajudar  o  cliente  ou  para  alcançar  um  objetivo   determinado (BULECHECK; McCLOSKEY, 1989).

            As prescrições podem ser  relacionadas  a  coleta  de  dados, necessária tanto para o diagnóstico de enfermagem  quanto  medico. Podem ser realizadas, de forma co-responsável  com  o  medico,  em resposta a diagnósticos médicos.

            As  prescrições  englobam  também   as   atividades   diárias essenciais que não podem ser executadas  pelo  cliente  e  aquelas dirigidas para avaliação da terapêutica (SILVA; NOBREGA, 1992).

            A  credibilidade  sobre  a  pratica  de  enfermagem   repousa principalmente sobre as atividades de  enfermagem  resultantes  de diagnósticos. Quando um diagnóstico e feito, a  enfermeira  tem  a obrigação Ética e legal de prestar um tratamento.

            A identificação e a conseqüente classificação sobre o que  as enfermeiras fazem  quando  cuidam  de  indivíduos  ou  grupos  são componentes críticos para o desenvolvimento dos  conhecimentos  de enfermagem (GLICK, 1992; CRUZ et al, 1993).

            Considerações Finais

            Novos instrumentos estão sendo propostos para  implementar  o processo de trabalho em enfermagem. Estes instrumentos, dos  quais destacamos o diagnóstico e a prescrição, ajudam-nos a  identificar as respostas da nossa clientela aos problemas de saúde e a  tratar (ou ajudar a clientela a se tratar) estas mesmas respostas.

            Cabe ressaltar que estudos sobre diagnósticos  de  enfermagem tem sido implementados na busca de um conhecimento  mais  profundo sobre os diagnósticos freqüentes em um  determinado  grupo  humano (KIM et al, 1982;  CRUZ;  ARCURI,  1990;  NÓBREGA,  1991).  Com  a identificação   dos   diagnósticos   surge   concomitantemente   o questionamento sobre a seleção de prescrições  para  esses  mesmos diagnósticos.

            Consideramos esses estudos importantes porque o  conhecimento de diagnósticos  freqüentes  em  uma  determinada  clientela  pode facilitar o planejamento global da assistência. Esse  planejamento permite prever que tipo de prescrições são necessárias, os  custos das  atividades  e  os  recursos   humanos   exigidos   para   sua implementação. Com base na tríade diagnóstico-prescrição-resultado podemos estabelecer critérios  de  qualidade  para  assistência  e avaliar melhor a relação custo/beneficio.

            No Brasil,  os  estudos  sobre  diagnósticos,  prescrições  e resultados a luz do referencial proposto pela  NANDA  e  pelo  ICN encontram-se numa fase  emergente,  mas    delineiam  linhas  de pesquisa.

            Os  pesquisadores  recomendam,  inclusive,  que   se   estude sistematicamente  essas  atividades,  visando  a   validação   das taxonomias de diagnóstico e prescrição, tendo em vista a crescente necessidade de definição da  Enfermagem  enquanto  profissão  para facilitar a pratica assistencial, o ensino e a pesquisa.

            Abstract.  This  paper   discuss   the   nursing   activities (diagnoses    and    interventions)    based    on    professional literature. Conclusions are related to  the  importance  of  these activities in defining the nursing scope of practice.

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