Nursing evidence-based practice guidelines for acid base imbalance in ICU - Systematic Literature Review
Prática de enfermagem baseada em evidência sobre desequilíbrio ácido-base em UTI - Revisão Sistematizada da Literatura
Débora Moraes Reis da Silva1, Isabel Cristina Fonseca da Cruz2
1Enfermeira. Aluna do Curso de Especialização em Enfermagem em Cuidados Intensivos. Universidade Federal Fluminense (UFF). deboramoraes@outlook.com.br
2Titular da UFF. isabelcruz@id.uff.br
Abstract: Acid-base disorders are conditions commonly found in Intensive Care Unit patients and occur as an attempt by the body to keep the pH within normal parameters in order to preserve cellular functions. These alterations impair the normal regulation of metabolic and enzymatic processes in the body, with high risk for multiple organ dysfunction and death. Objective: To review the nursing guidelines based on evidence that will help the intensive nurse in the identification and treatment of acid-base disorders, within 7 days. Methodology: This is an systematic review of the literature, according to the PICOT methodology, whose data collection was conducted in the period from 2012 to 2019, in the electronic databases LILACS, Scielo, BDENF and PubMed. Results: The results reveal 10 publications that were grouped into three categories of analysis: Interpretation of gasometric tests, Care during blood collection for gasometry, Nursing assistance in the treatment of acid-base imbalance. Conclusion: During the patient's hospitalization period, several variables can influence the acid-base balance and the knowledge about blood collection and the adequate interpretation of the gasometric data become necessary for holistic care. It is up to the nurse professional to associate the clinic with the changes in laboratory value that occur with the imbalance and to evaluate the treatment options, maintaining active participation with the multiprofessional team for the reestablishment of blood homeostasis.
Key-words: Acid-Base Imbalance; Intensive Care Units; Blood Gas Analysis; Nursing Care.
Resumo: Os distúrbios ácido-base são condições comumente encontradas em pacientes de Unidades de Terapia Intensiva e ocorrem como uma tentativa do organismo de manter o pH dentro dos parâmetros normais a fim de preservar as funções celulares. Essas alterações prejudicam a regulação normal dos processos metabólicos e enzimáticos do organismo, com risco elevado para disfunção múltipla de órgãos e óbito. Objetivo: Revisar as diretrizes de enfermagem com base em evidência que ajudarão ao enfermeiro intensivista na identificação e tratamento de distúrbios ácido-base, no tempo de 7 dias. Metodologia: Trata-se de uma revisão sistematizada da literatura, de acordo com a metodologia PICOT, cuja coleta de dados foi realizada no período de 2012 a 2019, nas bases eletrônicas LILACS, Scielo, BDENF e PubMed. Resultados: Os resultados revelam 10 publicações que foram agrupadas em três categorias de análise: Interpretação de exames gasométricos, Cuidados durante coleta de sangue para gasometria, Assistência de enfermagem no tratamento de desequilíbrio ácido-base. Conclusão: Durante o período de internação do paciente, inúmeras variáveis podem influenciar no equilíbrio ácido-base e o conhecimento quanto a coleta de sangue e a interpretação adequada dos dados gasométricos se tornam necessários para o cuidado holístico. Cabe ao profissional enfermeiro associar a clínica as mudanças de valor laboratorial que ocorrem com o desequilíbrio e avaliar as opções de tratamento, mantendo participação ativa junto a equipe multiprofissional para o reestabelecimento da homeostase sanguínea.
Palavras-chave: Desequilíbrio Ácido-Base; Unidades de Terapia Intensiva; Gasometria; Cuidados de Enfermagem.
INTRODUÇÃO
Alterações no equilíbrio ácido-base são condições comumente encontradas em pacientes de Unidades de Terapia Intensiva (UTI). O desequilíbrio ocorre como uma tentativa do organismo de manter os valores de potencial de Hidrogênio (pH) sanguíneo dentro dos parâmetros normais e reflete a gravidade da doença subjacente do paciente crítico1.
Os desequilíbrios ácido-base mais comuns em ambientes de terapia intensiva são os distúrbios ácido-base mistos e acometem mais da metade dos pacientes críticos internados.2 Essas alterações prejudicam a regulação normal dos processos metabólicos e enzimáticos do organismo, com risco elevado para disfunção múltipla de órgãos e óbito, sendo causadas por condições como choque circulatório, insuficiência renal, cetoacidose diabética, distúrbios gastrointestinais e doenças pulmonares3.
A incidência de distúrbios ácido-base em UTI reitera a necessidade de avaliação dos níveis de gases sanguíneos arteriais, com análise das funções metabólicas e respiratórias. O reconhecimento do desequilíbrio ácido-base é fundamental para o cuidado do paciente criticamente enfermo e a avaliação do estado ácido-base se inicia, na prática clínica, pela medição da gasometria arterial1.
A gasometria arterial é um exame invasivo que consiste na punção arterial para obtenção de amostra de sangue para realização do diagnóstico hemogasométrico4. A definição da desordem ácido-base a partir da interpretação precisa do exame de gasometria permite a compreensão da fisiopatologia e a adoção de medidas terapêuticas específicas, contribuindo para a eficácia do tratamento5.
A enfermagem atua como uma parte fundamental da estrutura organizacional hospitalar e, no ambiente de terapia intensiva, desempenha importante papel assistencial e gerencial nos cuidados intensivos ao paciente crítico. A assistência de enfermagem deve ser direcionada pela implantação da Sistematização da Assistência de Enfermagem (SAE), garantindo o planejamento e a continuidade das intervenções a partir de analises críticas e raciocínio lógico a fim de que seja realizado um cuidado qualificado6.
A avaliação da oxigenação, ventilação e estado ácido-base do paciente faz parte da visão integral que deve ser realizada pelo enfermeiro durante o cuidado intensivo. O enfermeiro deve ser capacitado técnica e cientificamente para atuar tanto na coleta do material sanguíneo quanto na interpretação dos exames, assim como para o desenvolvimento de atividades voltadas para a estabilização e manutenção da homeostase do paciente, em conjunto com a equipe multiprofissional4.
Situação-problema: escassez de informação sobre a prática com base em evidências científicas e suas diretrizes para a resolução do diagnóstico de enfermagem desequilíbrio ácido-base para o paciente de alta complexidade sob cuidados intensivos.
Objetivo: revisar as diretrizes de enfermagem com base em evidência que ajudarão ao enfermeiro intensivista na identificação e tratamento de distúrbios ácido-base, no tempo de 7 dias.
Questão Prática: com base em evidência, como identificar e tratar no paciente de alta complexidade o desequilíbrio ácido-base em um período de 7 dias de internação?
METODOLOGIA
Trata-se de uma revisão sistematizada da literatura, que tem como objetivo investigar o conhecimento atual sobre o manejo dos distúrbios ácido-base em UTI pela enfermagem, com base nas evidências disponíveis. A revisão sistemática é considerada um estudo secundário, baseando-se em estudos primários para definir a melhor evidência para tomada de decisões na prática diária. São úteis tanto para integrar conhecimentos de diversos estudos, quanto para identificar temas que carecem de evidências, orientando investigações futuras. A elaboração de uma revisão sistemática ocorre a partir de 5 etapas, sendo elas a definição da pergunta, a busca da evidência, a revisão e seleção dos estudos, a análise da qualidade metodológica dos estudos e a apresentação dos resultados7.
A questão norteadora foi definida com base na estratégia PICOT: população, intervenção, comparação, resultado (outcome) e tempo (Quadro 1)8. A coleta de dados deu-se pela busca de publicações científicas indexadas nas bases eletrônicas LILACS, Scielo, BDENF e PubMed, sendo utilizados como critérios de inclusão publicações em periódicos de enfermagem no período de 2012 a 2019, nos idiomas inglês e português, cujo assunto fizesse referência a temática de distúrbios eletrolíticos em UTI. Na busca foi utilizada a combinação dos seguintes descritores: Desequilíbrio Ácido-Base; Unidades de Terapia Intensiva; Gasometria; Cuidados de Enfermagem.
Os artigos encontrados foram agrupados em uma tabela e avaliados quanto sua evidência científica por tipo de estudo de acordo com os critérios do Oxford Centre for Evidence-based Medicine9.
Quadro 1 – Descrição dos componentes da estratégia PICOT. Niterói. 2020.
Acrônimo |
Descrição |
Componente da questão prática |
P |
Paciente ou problema |
Paciente adulto/idoso de alta complexidade com o diagnóstico de desequilíbrio ácido-base. |
I |
Intervenção |
Cuidados de enfermagem |
C |
Controle ou comparação |
Não se aplica |
O |
Desfecho (“outcomes”) |
Controle dos distúrbios ácido-base |
T |
Tempo |
Percurso crítico de 7 dias |
Fonte: Elaborado pelas autoras, 2020.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Foram encontrados 619 estudos, dos quais foram excluídos artigos que não correlacionavam com o tema e artigos duplicados, resultando em 10 artigos finais para análise (Tabela 1). Foram encontrados quatro estudos de caso, dois estudos descritivos, um estudo exploratório, uma revisão não sistemática da literatura, um estudo baseado em opinião de especialistas e apenas uma revisão sistemática da literatura com estudos randomizados.
Após a leitura dos artigos, emergiram três categorias de análise: Interpretação de exames gasométricos, Cuidados durante coleta de sangue para gasometria, Assistência de enfermagem no tratamento de desequilíbrio ácido-base.
Tabela 1: Publicações localizadas nas bases eletrônicas. Niterói. 2020.
Autor(es), data e país |
Objetivo (s) da pesquisa |
População/ amostra |
Tipo do estudo |
Principal (is) recomendação (ões) |
Nível de evidência |
Barker ME. 2015. EUA |
Revisar a literatura comparando complicações de soro fisiológico a 0,9% com “soluções líquidas balanceadas” no ambiente de cuidados intensivos. |
04 estudos randomizados |
Revisão sistemática da literatura |
Os pacientes que foram randomizados para receber infusões de solução salina a 0,9% tiveram uma acidose mais grave devido ao aumento dos níveis de cloreto sérico. A partir dos dados disponíveis, o fluido intravenoso restritivo ao cloreto, como o plasmalyte, parece reduzir os distúrbios de base ácida e melhorar os resultados dos pacientes. |
1A |
Christensen M; Chen F. 2013. EUA. |
Apresentar a revisão do caso de enfermagem de paciente internado em unidade de terapia intensiva com diagnóstico de choque séptico e uso de fórmulas ácido-base à beira do leito para subsidiar a tomada de decisão clínica. |
Paciente em UTI com diagnóstico de choque séptico |
Estudo de caso |
O uso de interpretação ácido-base 'avançada' para guiar seus cuidados de enfermagem forneceu uma plataforma a partir da qual avançou uma compreensão mais profunda das complexidades que o paciente crítico frequentemente apresenta. |
4 |
Ellis MF. 2015. EUA. |
Explicar o uso do bicarbonato em pacientes com acidose metabólica |
|
Opinião de especialistas |
A administração da terapia com bicarbonato na acidose deve ser reservada para situações em que o benefício é evidente. O uso de bicarbonato deve ser reservado para pacientes criticamente enfermos com acidose metabólica aguda e grave. |
5 |
Gooch MD. 2015. EUA. |
Revisão da fisiologia do equilíbrio ácido-básico e eletrolítico, seus distúrbios comuns, causas associadas, manifestações clínicas e implicações de gerenciamento para os profissionais de enfermagem. |
Paciente admitido em UTI com distúrbios ácido-base |
Estudo de caso. |
Os desequilíbrios ácido-base e eletrolíticos não são diagnósticos isolados e geralmente são resultado de um processo de doença ou toxina. A identificação da causa é crucial para o manejo adequado. |
4 |
Masco NA. 2016. EUA. |
Reconhecer as mudanças de valor laboratorial que ocorrem com o desequilíbrio e avaliar as opções de tratamento, incluindo infusões intravenosas. |
Paciente internado em uma Unidade de Terapia Intensiva com distúrbio ácido-base. |
Estudo de caso. |
Os enfermeiros devem estar cientes dos desequilíbrios ácido-bases. O reconhecimento e a intervenção precoces podem ajudar a alcançar o equilíbrio rapidamente e prevenir o agravamento da condição do paciente. |
4 |
Parry A, Higginson R. 2016. EUA |
Fornecer aos enfermeiros informações sobre o uso seguro e eficaz e o manejo de cateteres arteriais. |
|
Estudo descritivo |
Os cateteres arteriais são o padrão ouro para medição precisa da pressão arterial e amostragem seriada de gasometria em cuidados intensivos. |
5 |
Pinto JMA; Saracini KC; Lima LCA; Souza LP; Lima MG; Algeri EDBO. 2017. Brasil. |
Evidenciar as aplicações e implicações da gasometria arterial para enfermagem, propondo os principais rótulos diagnósticos de enfermagem e suas intervenções baseadas no processo de enfermagem e legislação vigente. |
17 artigos publicados em periódicos entre os anos 2001 a 2015 |
Estudo exploratório qualitativo, descritivo realizado por meio de revisão bibliográfica. |
Torna-se essencial que o enfermeiro esteja atualizado e seja capaz cientificamente e tecnicamente de coletar sangue arterial |
5 |
Pompey J; Abraham-Settles B. 2019. EUA. |
Este artigo concentra-se na análise e interpretação básicas da GSA, discute as combinações de desequilíbrios que podem ocorrer e analisa os mecanismos compensatórios que surgem como resultado. |
|
Estudo descritivo |
A avaliação do paciente continua a ser a prioridade mais alta para avaliar a condição geral do paciente, mas a análise do estado ácido-base desempenha um papel importante no gerenciamento do paciente. |
5 |
Soler VM; Sampaio R; Gomes MR. 2012. Brasil |
Apresentar evidências científicas sobre a coleta de sangue para gasometria arterial no campo de atuação do enfermeiro. |
13 artigos publicados no período de 2000 a 2010. |
Revisão não sistemática da literatura |
É fundamental que o enfermeiro esteja capacitado e habilitado para a coleta de sangue para GA. Resultados mais exatos proporcionam a base para otimizar terapêuticas, quando da existência de distúrbios do equilíbrio ácido-básico. |
5 |
Lian JX. 2013. EUA. |
Traduzir as informações de gases sanguíneos arteriais em benefícios clínicos, com três estudos de caso que enfocam o uso de análise de gases sanguíneos para gerenciar ventilação mecânica. |
03 pacientes com distúrbios ácido-básicos em uso de ventilação mecânica |
Estudos de caso |
Ao compreender a ventilação mecânica e como usar os resultados dos gases sanguíneos arteriais, as estratégias de ventilação podem ser alteradas conforme necessário para lidar com as mudanças na condição do paciente. |
4 |
Fonte: Elaborado pelas autoras, 2020.
Interpretação de exames gasométricos.
A incapacidade do organismo de manter a homeostase dos gases sanguíneos gera a descompensação clínica, que pode ser mensurada em tipo e grau de acordo com o exame de gasometria arterial. Esse exame desempenha importante papel para o diagnóstico e tratamento eficaz de pacientes hospitalizados. Os principais parâmetros gasométricos utilizados para avaliação do equilíbrio ácido-base orgânico são o pH, a PaO2, a PaCO2 e o HCO310.
Para a análise básica dos gases sanguíneos é recomendado um método de três etapas: etapa 1, avaliação do nível de pH; etapa 2, avaliação do nível de PaCO2; etapa 3, avaliação dos níveis de HCO3 e PaO2. Estudos de análise de gasometria venosa indicam que o sangue venoso tem um nível de pH mais baixo, menos oxigênio e PaCO2 mais alto em comparação com o sangue arterial, não sendo indicado como parâmetro para avaliação do equilíbrio ácido-base do paciente10,11.
O valor do pH reflete o grau de acidez e alcalinidade do sangue. Em condições normais, o metabolismo celular libera continuamente ácidos que são eliminados do corpo principalmente através da expiração e urina, mantendo um pH normal de 7,35 a 7,45. Quando ocorre uma mudança na concentração de íons de hidrogênio, os fluidos corporais podem se tornar ácidos, com pH menor que 7,35, ou alcalinos, com pH maior que 7,45, despertando sistemas de regulação ácido-base como as soluções tampão, o sistema respiratório e o sistema renal11.
A PaCO2 é utilizada para determinar se o desequilíbrio se origina no sistema respiratório ou se um desequilíbrio metabólico está sendo compensado pelo sistema respiratório. Valores de PaCO2 maior que 45 mmHg com pH diminuído sugerem acidose respiratória, enquanto a concentração de PaCO2 menor que 35 mmHg com pH aumentado indicam alcalose respiratória. A compensação pelo sistema respiratório ocorre através do controle dos níveis de dióxido de carbono pela regulação da frequência respiratória, eliminando ou retendo CO2 pela hiperventilação ou hipoventilação em caso de desequilíbrio metabólico, na tentativa de manter o nível de pH dentro dos parâmetros de normalidade10,11,12.
Por outro lado, o nível de HCO3 pode determinar se a causa do desequilíbrio é de etiologia metabólica ou se o sistema metabólico está compensando um desequilíbrio respiratório. Níveis de HCO3 maiores que 26 mEq/L com pH elevado indicam alcalose metabólica, enquanto a concentração de HCO3 menor que 22 mEq/L com pH diminuído indica acidose metabólica. A compensação pelo sistema metabólico se dá através da excreção ou retenção renal de íons hidrogênio (H+) e bicarbonato na vigência de um desequilíbrio respiratório, com a finalidade de manter o valor de pH dentro dos limites normais10,11,12.
Cuidados durante coleta de sangue para gasometria.
No contexto da equipe de enfermagem, o enfermeiro é o profissional responsável pela execução da coleta de sangue para gasometria nas situações em que é indicada avaliação do equilíbrio ácido-base e análise da função respiratória e perfusão tecidual. A coleta de sangue arterial demanda conhecimento específico e competência técnico-científica para que o procedimento seja isento de complicações10.
Preferencialmente, a artéria radial é a via de escolha para coleta de sangue, por possuir menor risco de isquemia em casos de lesões, facilidade de acesso ao vaso e por apresentar tecidos periarteriais menos sensíveis à dor. Quando a punção da radial é contraindicada, podem ser utilizadas as artérias braquial ou femoral como alternativas para coleta de sangue. As complicações mais frequentes da coleta de sangue arterial incluem equimose local e hematoma pós punção, retenção urinária em punções femorais e perda da permeabilidade do vaso em punções radiais4,10.
Para o procedimento de coleta de sangue arterial são encontrados diagnósticos de enfermagem dentro dos domínios de segurança/proteção, conforto, respostas de enfrentamento e percepção/cognição segundo a taxonomia da NANDA. São exemplos os diagnósticos de ansiedade, medo, conhecimento deficiente, dor aguda, integridade da pele prejudicada, conforto prejudicado, risco de trauma vascular, risco de infecção e risco de lesão4.
As principais intervenções de enfermagem incluem: explicar ao paciente quanto ao procedimento e esclarecer dúvidas, oferecer apoio emocional e medidas de conforto, realizar o teste de Allen antes da coleta do exame, utilizar agulha de pequeno calibre, realizar compressão após a punção por no mínimo 10 minutos e manter supervisão da pele após o procedimento, avaliando presença de sinais flogísticos e presença de hematomas4.
Quando é necessária a monitorização da pressão arterial em tempo real, para identificação rápida e precisa de alterações dos níveis pressóricos do paciente, é instalada uma via de acesso arterial, podendo ser utilizada também para dosagens frequentes e seriadas dos gases e do pH sanguíneo sem a necessidade de diversas punções arteriais. É importante que o membro de inserção do cateter seja avaliado periodicamente quanto a sinais de má perfusão sanguínea e sangramento, além de manter técnica asséptica para sua manipulação durante a coleta de sangue, a fim de garantir o uso seguro e eficaz do cateter arterial13.
Após a coleta de sangue, a seringa deve ser manejada de modo a minimizar a exposição ao ar, retirando imediatamente as bolhas de ar para que não haja alteração dos valores dos gases no resultado do exame. É possível que o contato com o ar aumente os valores de PO2 e diminua os valores de PCO2 devido ao equilíbrio gasoso com o sangue10,13.
Assistência de enfermagem no tratamento de desequilíbrio ácido-base.
A homeostase ácido-base é fundamental para a manutenção dos processos fisiológicos a níveis tecidual e celular no corpo humano, podendo sofrer alterações por uma série de fatores clínicos e terapêuticos. Pequenas mudanças no equilíbrio ácido-base podem alterar significativamente os processos fisiológicos do organismo, assim como alterar a farmacocinética de drogas administradas12.
A análise dos gases arteriais fornece uma compreensão geral sobre a oxigenação, equilíbrio ácido-base, função pulmonar e estado metabólico do paciente, contribuindo para uma visão holística diante de um paciente gravemente enfermo14. A correta interpretação dos resultados gasométricos se inicia com a avaliação clínica cuidadosa do paciente e o conhecimento dos princípios básicos da regulação ácido-base11. Contudo, a avaliação do equilíbrio ácido-base pela enfermagem para tomada de decisões clínicas ainda é limitado15.
O enfermeiro deve ser capaz de reconhecer as possíveis causas e os sinais e sintomas que indicam desvios do normal. O impacto no paciente depende do tipo e gravidade do desequilíbrio ácido-base e os enfermeiros, por serem responsáveis pela avaliação e monitoramento do paciente nas 24h, possuem papel importante no cuidado do paciente hospitalizado. Distúrbios não compensados apresentam consequências neurológicas, cardiovasculares, respiratórias e metabólicas, sendo importante a avaliação contínua do nível de consciência e monitoramento dos sinais vitais para o reconhecimento imediato de alterações clínicas12.
A identificação precoce de distúrbios ácido-base, tanto pela suspeita clínica quanto pela confirmação através da análise gasométrica, é primordial para a prevenção de eventos de maior gravidade com risco à vida. A acidose metabólica grave, por exemplo, se não revertida, resulta em arritmias fatais relacionadas a redução da contratilidade miocárdica, como a fibrilação ventricular. Além disso, a acidemia pode resultar em ineficácia de algumas drogas resultando em falha terapêutica, como o comprometimento da ligação da noradrenalina aos seus receptores, resultando em ineficácia da catecolamina infundida12,16.
As infusões medicamentosas, de competência da equipe de enfermagem, podem tratar ou causar desequilíbrio do pH sanguíneo, sendo responsabilidade do enfermeiro identificar o impacto da terapia intravenosa no equilíbrio ácido-base e intervir quando necessário. Durante o período de internação do paciente, as condições de acidose e alcalose principalmente metabólicas são frequentemente influenciadas pelas infusões intravenosas12,17.
Em particular, as infusões de cloreto de sódio a 0,9% estão frequentemente relacionadas a ocorrência de acidose metabólica hiperclorêmica. A solução salina a 0,9% possui uma concentração aumentada de cloreto (154 nmol/L), que possui carga negativa, de modo que sua infusão em grande volume para ressuscitação volêmica ativa mecanismos compensatórios que aumentam a carga positiva (H+), a fim de manter a eletroneutralidade plasmática, gerando um quadro de acidose hiperclorêmica, além de possuir efeito renal deletério. Estudos sugerem a administração de plasma lyte ou de ringer com lactato como fluidos intravenosos por serem fisiologicamente mais balanceados em seus eletrólitos12,17.
Em casos de acidose metabólica, o bicarbonato de sódio é reservado para as condições em que o pH é menor ou igual a 7,2. O tratamento deve ser direcionado a eliminar a causa, como em casos de cetoacidose diabética, infecção grave, choque circulatório, insuficiência renal, entre outros, e deve apoiar a ventilação e o fornecimento de oxigênio aos tecidos12,16.
A alcalose metabólica é frequentemente causada por condições de aumento de bicarbonato sérico, por depleção de cloreto pela perda excessiva de volume em condições de vômitos, diarreia ou diurese. Seu tratamento se inicia com a reposição de líquidos e eletrólitos, sendo guiada pela causa e quantidade de cloreto na urina. Em uso prolongado, os diuréticos tiazídicos e de alça são responsáveis por aumentar a excreção de íons de potássio e hidrogênio, gerando alcalose metabólica quando não há reposição adequada; podendo ser tratada com a redução da dose ou interrupção e uso de medicamentos alternativos12,18.
Quanto ao manejo dos distúrbios ácido-base de origem respiratória, o ventilador mecânico é um dispositivo de assistência médica frequentemente utilizado em ambientes de terapia intensiva com grande valor terapêutico. Os parâmetros ventilatórios devem ser ajustados tanto para melhorar a oxigenação e ventilação, quanto para auxiliar no tratamento dos desequilíbrios ácido-base. Intervenções que alterem a frequência respiratória e/ou o volume corrente podem ajudar a controlar a hipercapnia ou hipocapnia, promovendo a retenção ou eliminação de CO2 e a correção do desequilíbrio ácido-base14.
O tratamento dos distúrbios ácido-base depende da etiologia subjacente, sendo esta identificada através da interpretação gasométrica analisada em conjunto com os dados clínicos em casos agudos. É indicado que sejam realizadas coletas seriadas dos gases e do pH sanguíneo, possibilitando a adequação do tratamento de acordo com a evolução do quadro clínico.
CONCLUSÃO
As alterações do equilíbrio ácido-base são problemas comumente encontrados no paciente hospitalizado em terapia intensiva, resultantes tanto das complicações da patologia subjacente quanto das infusões intravenosas administradas. É importante que a enfermagem mantenha vigilância clínica constante sobre o paciente, sendo capaz de reconhecer precocemente os sinais e sintomas que indicam desvios do normal. A equipe de enfermagem deve estar atenta a condições de perdas gastrointestinais, alteração do nível de consciência, mudança do padrão respiratório, bem como alterações da frequência e ritmo cardíaco, frequentemente associados a distúrbios ácido-base.
Cabe ao profissional enfermeiro associar a clínica as mudanças de valor laboratorial que ocorrem com o desequilíbrio e avaliar as opções de tratamento, mantendo participação ativa junto a equipe multiprofissional para o reestabelecimento da homeostase sanguínea. As avaliações posteriores devem ser realizadas a partir de dosagens frequentes e seriadas dos gases e pH arterial, permitindo o monitoramento da eficácia do tratamento e os ajustes necessários de acordo com os resultados obtidos.
O manejo adequado dos distúrbios através da terapia medicamentosa e cuidados de enfermagem permite a correção das alterações decorrentes dos desequilíbrios ácido-base e a prevenção de agravos com risco à vida, garantindo uma assistência de qualidade focada na segurança do paciente. Contudo, a literatura atual sofre uma escassez de evidências de alta qualidade sobre a prática da enfermagem no cuidado do paciente com alterações ácido-base. Estudos que enfoquem o manejo do paciente com distúrbios ácido-base pela equipe de enfermagem são necessários para aumentar a qualidade da assistência prestada e contribuir para a segurança do paciente hospitalizado.
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