JSNCARE

Alcoholic intoxication in the emergency department – evidenced based nursing practice

Intoxicação alcoólica no setor de emergência – prática de enfermagem baseada em evidência

                                              

José Helder Alves Aragão1, Isabel Cruz2

 

1 Enfermeiro. Aluno do Curso de Especialização em Enfermagem em Cuidados Intensivos em Clientes em Unidade de Emergência (2007) da Universidade Federal Fluminense (UFF). josehelder@predialnet.com.br; 2 Doutora em Enfermagem. Professora Titular da UFF. isabelcruz@uol.com.br

 

Abstract: Worldwide scientific literature and the secular press emphasize that alcohol abuse frequently associates itself to the occurrences of diverse forms of trauma. Currently alcohol is a problem of Public Health. This study characterizes itself as a essay of a bibliographical revision and has as its objective to identify the scientific output of nursing, from the period of 2002 to 2007, concerning alcoholic intoxication, analyzing its application to the practice of nursing. Ten scientific articles were gathered together, being six in Portuguese and four in English. The results reveal a great variety of themes being that these favor a discreet tendency by giving evidence to the lack of preparation of nurses in caring for alcoholic patients and seeking to strengthen the knowledge of these professionals about the theme. The bibliography revealed a single source that proclaims “brief interventions” in caring for patients, although signaling toward a registered structure of medical care, making necessary, still, greater investigations to be annexed to the body of knowledge of nursing and utilized by its professionals.  

Key-words: Alcoholic Intoxication; Nursing; Emergency Nursing 

Resumo: A literatura científica mundial e a imprensa leiga ressaltam que o abuso do álcool associa-se frequentemente as ocorrências de diversas formas de trauma. Na atualidade o álcool é um problema de Saúde Pública. Este estudo caracteriza-se como descritivo de revisão bibliográfica e objetiva-se a identificar a produção científica de enfermagem, no período de 2002-2007, sobre intoxicação alcoólica, analisando sua aplicabilidade à prática de enfermagem. Foram levantados dez (10) artigos científicos, sendo seis (06) em língua portuguesa e quatro (04) em língua inglesa. Os resultados revelam uma grande variedade de temáticas sendo que privilegiam uma tendência discreta ao evidenciar a falta de preparo dos enfermeiros em assistir os pacientes alcoolistas e buscar fortalecer o conhecimento destes profissionais sobre a temática. A bibliografia revelou uma única fonte que preconiza “breves intervenções” para o atendimento dos pacientes, embora sinalizem para uma estrutura protocolar de atendimento, necessitam, ainda, de maiores investigações para serem anexados ao corpo de conhecimentos da enfermagem e utilizadas pelos seus profissionais. 

Palavras-chave: Intoxicação Alcoólica; Enfermagem; Enfermagem em Emergência. 

 

INTRODUÇÃO

 

            A utilização do álcool pelo homem não é nova. Desde que o homem fermentou alguns alimentos, a bebida passou a fazer parte do dia-a-dia de povos antigos. Observa-se que com o passar do tempo, o álcool tornou-se um problema de saúde pública. Alguns estudos de linha histórica apontam a sua utilização, desde os tempos remotos, com objetivos nítidos de socialização, inspiração e tranquilidade1 . No entanto, os escritos de Platão, Sócrates e Xenofan apontam o uso abusivo do álcool e da cerveja como um sério problema para algumas civilizações 2  . Acrescenta-se, inclusive a esta afirmativa, que as sociedades alternam-se momentos de maior e menor tolerância ao consumo de substâncias psicoativas, chegando em alguns períodos até mesmo estabelecer-se uma exaltação social3.

            No Brasil as indústrias de bebidas alcoólicas gastam fortunas em propagandas para veicular a bebida à situações prazerosas, utilizando artistas famosos e carismáticos na divulgação de suas marcas. No entanto, tais propagandas omitem os malefícios que o consumo exagerado do álcool pode trazer para a sociedade. Por ser uma droga lícita e até bem aceita, seu consumo é estimulado e atualmente é responsável por grande parte dos acidentes de trânsito e trabalho 4. Além disso, contribui para a desagregação familiar, perda de produtividade no estudo e no trabalho, além de inúmeras causas de patologias5

            A partir da abordagem primária é possível, logo a seguir, realizar um exame físico cuidadoso e detectar nos pacientes alcoolizados sinais de complicações tais como: aspiração brônquica, crises hipertensivas, traumatismos cranioencefálicos e sinais de cronicidade ou comorbidades (hepatomegalia, desnutrição, infecções, etc.).

            A literatura científica mundial e a imprensa leiga ressaltam que o abuso de álcool associa-se frequentemente a ocorrências de diversas formas de trauma. Alguns estudiosos do assunto pontuam que o consumo excessivo de álcool lidera como a terceira causa de mortalidade nos EUA7. Além disso, sessenta e um porcento (61%) dos acidentes automobilísticos estão relacionados ao seu consumo 8. No Brasil, mais precisamente em São Paulo constatou-se que mais de 50% das vítimas fatais de acidentes automobilísticos apresentavam dosagens alcoólicas no sangue, muitas destas em níveis altos9

Atualmente o Ministério da Saúde, através de campanhas na mídia,  tem buscado desmistificar o prazer ocasionado pela bebida, apresentando o seu consumo exagerado de forma negativa: bebida como sinônimo de acidente de trânsito. Levantamento em cidades brasileiras com mais de 200 mil habitantes constatou recentemente que 70% das pessoas já experimentaram algum tipo de bebida alcoólica e que 11% da população são dependentes de álcool. Entre os homens jovens (18 a 24 anos) a taxa de dependência é bastante alta, atingindo 24% 9.

            Embora a utilização do álcool seja lícita, observa-se contradições quanto ao seu uso, visto que ao mesmo tempo que a sociedade aceita e releva o seu consumo, em algumas situações age com preconceito, como durante o atendimento de usuários em situações de emergência. Tal fato, talvez seja explicado pela educação recebida pelos enfermeiros, durante sua formação, que identificam os usuários de álcool como pessoas que bebem voluntariamente e necessariamente não são considerados como doentes10

Para muitos enfermeiros o alcoolismo é considerado como uma fraqueza moral e não como uma doença crônica que deve ser tratada. Enfermeiros e profissionais de saúde têm apresentado atitudes negativas com relação ao uso de álcool e drogas e uma percepção pessimista quanto ao resultado do tratamento, sendo que as enfermeiras tendem a ser mais moralistas com relação aos bebedores e os percebem como fracos de caráter do que como doentes, além de pouco os tolerarem11.

Para este estudo, consideramos o conceito preconizado pela Organização Mundial de Saúde para alcoolismo que é o estado psíquico e algumas vezes físico, que resulta da ingestão do álcool, caracterizado por reações de comportamentos e outras que sempre incluem compulsão para ingerir álcool de modo contínuo ou periódico, a fim de experimentar seus efeitos psíquicos e por vezes evitar o desconforto de sua falta; a tolerância pode estar presente ou não12.

            O atendimento destes pacientes também é precarizado pela falta de preparo psicológico dos profissionais de saúde e de conhecimento no desenvolvimento da assistência a este tipo de clientela. Além disso, esse atendimento fica diluído e em segundo plano; a nosso ver um total descaso diante da gravidade desses pacientes.

            A partir do exposto, este estudo de revisão bibliográfica objetiva-se a identificar a produção científica de enfermagem no período de 2002-2007 sobre intoxicação alcoólica, analisando sua aplicabilidade à prática de enfermagem. 

METODOLOGIA 

            Trata-se de uma pesquisa exploratória, bibliográfica e baseada em consulta sistemática a bases de dados (bibliográficos) e no acesso não sistemático a materiais em bibliotecas especializadas na área de saúde e outros disponíveis na WEB localizados por meio de ferramentas de busca. Para a consulta sistemática foi utilizada a base de dados bibliográficos da MEDLINE         com uso das expressões de pesquisa intoxicação, alcoolismo e emergência, com o estabelecimento de limites de tipo de publicação (artigos de enfermagem), data da publicação (a partir de 2002), idiomas (português, inglês e espanhol), o que se justifica por ser o alcoolismo um problema de saúde pública mundial. Na busca não sistemática foram consultados aleatoriamente materiais de obras referenciais como livros-texto na área de emergência, clínica e psiquiatria. Outros materiais foram acessados a partir de sua citação por autores dos trabalhos encontrados na pesquisa bibliográfica sistemática. Foram localizados seis  (06) artigos em língua portuguesa e quatro (04) em língua inglesa, além de literatura auxiliar para construir as demais fases da pesquisa.

            Os materiais recuperados foram classificados de acordo com autoria, data de publicação, país de origem, objetivo da pesquisa, tamanho da amostra, tipo do estudo e instrumentos utilizados na sua elaboração, principais achados e conclusões do(s) autor(es). Para constituir o corpo de conhecimentos necessários para a assistência de enfermagem foram utilizadas a classificação da NANDA (North American Diagnosis Association) para diagnóstico de enfermagem, a classificação da NIC (Nursing Interventions Classification) para as intervenções de enfermagem e a classificação da NOC (Nursing Outcomes Classification) para os resultados de enfermagem. 

ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS

Tabela – Publicações localizadas segundo o tema intoxicação alcoólica, mencionadas nas bases de dados. Niterói, 2007.

 

Autor(es), Data & País

Objetivo da Pesquisa

Tamanho da Amostra

Tipo do Estudo & Instrumen-tos

Principais Achados

Conclusões do(s) autor(es)

Pillon SC ;

Dezembro de 2005 Brasil13

Avaliar os conhecimentos adquiridos sobre os problemas relacionados ao uso de álcool.

Constituída por 512 participantes.

Estudo descritivo que utilizou como instrumento um questionário individual com respostas fechadas.

Deficiência na educação formal e atitudes negativas por parte dos enfermeiros frente ao alcoolismo.

O enfermeiro exerce uma função fundamental em identificar e talvez iniciar uma intervenção terapêutica;

necessidade de treinamento.

Luis MAV, Lunetta ACF;

Novembro de 2005 Brasil 14

Identificar o conhecimento produzido pela enfermagem brasileira sobre o tema álcool e outras drogas até 2004.

Constituída de 218 resumos.

Trata-se de uma pesquisa bibliográfica que consultou base de dados on line.

O conhecimento tendeu para três categorias temáticas: uso de álcool e outras drogas, populações vulneráveis e usuários de álcool e outras drogas.

A produção cadastrada nas bases de dados, disponíveis on line, é pequena.

 

 

 

 

 

Santos JRP, Marques IR;

Setembro de 2005 Brasil 15

Identificar  conhecimentos para prestar assistência de enfermagem a pacientes portadores da Síndrome de Abstinência.

Constituída de 16 trabalhos.

Pesquisa bibliográfica baseada em consulta  online.

Usar escalas de avaliação da síndrome, conhecer as manifestações clínicas, saber as terapêuticas existentes e as respectivas intervenções.

 

Conclui-se que a identificação destes conhecimentos contribui para uma assistência de enfermagem efetiva.

Vargas D, Labate RC, Costa Júnior ML;

Julho de 2003

Brasil 11

Verificar as atitudes de enfermeiros quanto à sua disposição para o tratamento ou punição de pacientes alcoolistas.

Constituída de 171 enfermeiros de um hospital geral de grande porte.

Estudo psicométrico que utilizou uma escala para mensurar as atividades dos enfermeiros frente aos pacientes alcoolistas.

A análise mostrou que os enfermeiros são favoráveis à conduta terapêutica para o alcoolismo, concebendo-o como uma doença.

Conclui-se que ao reconhecer o alcoolismo como uma doença, os enfermeiros amenizam os motivos para condenação e julgamentos.

Barroso PN, Fortes AN, Lopes MVO;

2005

Brasil 16

Analisar as publicações de artigos que versam sobre a temática cirrose hepática alcoólica.

Total de 62 publicações desde 1982 até 2003 que foram codificadas segundo as temáticas.

Estudo exploratório e descritivo que  utilizou consultas a Bireme, via Internet.

Contatou-se que, a partir da década de 90, houve um decréscimo gradativo no número de publicações ao longo dos anos.

Conclui-se que a temática das pesquisas desenvolvidas sobre cirrose hepática alcoólica sofreu uma mudança de perfil.

Lopes GT, Luis MAV;

Set-Out 2005 Brasil 17

Caracterizar o preparo do enfermeiro em relação ao fenômeno das drogas

A amostra foi de 122 alunos do último período acadêmico de quatro cursos de Enfermagem.

Trata-se de uma investigação descritiva cujo instrumento de coleta de dados utilizado foi um questionário (escala) auto-aplicável.

Evidenciou-se a existência de fragilidade nos conhecimentos teóricos específicos (álcool e drogas).

Conclui-se que a formação dos estudantes de enfermagem das escolas investigadas possui características positivas e dados contraditórios.

 

Crilly J, Chaboyer W, Creedy D;

Nov/2003; Estados Unidos 18

Identificar a incidência de violência por parte de pacientes contra os enfermeiros.

Constituída por 71 enfermeiros do serviço de emergência.

Estudo descritivo que utilizou fichas, dados e questionários guiados por uma revisão de literatura.

A violência no serviço de emergência contra os enfermeiros é um problema significativo.

Os enfermeiros devem informar e registrar os casos de violência à administração do hospital e à sociedade.

Rassool GH, Villar-Luis M; Dezembro 2004; Estados Unidos 8

Promover uma visão geral do abuso de álcool e drogas no Brasi.l

Não informado

Revisão de Literatura

Os enfermeiros têm um papel de destaque na prevenção e no tratamento do abuso de álcool e drogas.

Preconizam uma mudança na grade curricular da enfermagem que contemple o abuso de álcool e outras drogas.

Hyman Z; Novembro 2006; Estados Unidos 7

Explorar a literatura sobre intervenções breves no uso de álcool e o nível de aplicação destas pelos enfermeiros.

Não informado

Revisão de literatura de base de dados on-line.

Os enfermeiros reconhecem nas intervenções um legítimo papel da enfermagem e desejam participar de atividades relativas as mesmas.

A utilização das intervenções breves nos usuários de álcool de alto risco já é bem conhecida na literatura, embora pouco explorada pelos enfermeiros.

Willaing I, Ladelung S; Março 2005 Estados Unidos19

Identificar a ligação entre a prática relatada no atendimento hospitalar pelo enfermeiro aos pacientes que fazem uso abusivo de álcool e o seu nível de qualificação para o aconselhamento sobre alcoolismo.

Constituída de 522 enfermeiros.

Estudo descritivo que utilizou questionários auto-aplicáveis.

O nível de qualificação para aconselha-mento e atitudes influencia no cuidado ao paciente.

Todos os enfermeiros precisam de atualização nas questões relativas ao álcool.

 

Fonte: UFF Especialização Enfermagem em Cuidados Intensivos/Emergência/2007

            A partir dos artigos coletados para originar este estudo foi possível chegar a alguns resultados importantes quanto aos objetivos da pesquisa. Foram selecionados dezenove (19) artigos sendo que dez (10) deles propiciaram o processo investigativo com implicações para a prática de enfermagem. Seis (06) artigos científicos são referências em língua portuguesa e quatro (04) deles em língua inglesa.

            Quanto ao tipo de pesquisa seis (06) artigos caracterizam revisões bibliográficas e os demais evidenciam pesquisas de campo. Entende-se como pesquisa de campo aquela utilizada com o objetivo de conseguir informações e/ou conhecimentos acerca de um problema para o qual se preocupa uma resposta, ou de uma hipótese que se queira comprovar, ou, ainda, descobrir novos fenômenos ou as relações entre eles20.

            A análise do material evidenciou objetivos claros que apontaram tendências que incluem o conhecimento dos enfermeiros sobre o assunto, como a origem desse conhecimento, meios de divulgação e tendências da produção científica; avaliação da assistência prestada pelos enfermeiros no setor de emergência; análise das atitudes dos enfermeiros em punir ou tratar dos alcoolistas; análise de publicações de artigos sobre cirrose hepática; análise do preparo dos enfermeiros a partir de suas atitudes e crenças diante dos dependentes de drogas, principalmente o álcool; identificação da incidência de violência por parte dos pacientes alcoolistas contra os enfermeiros; o uso abusivo de drogas e álcool no Brasil, exploração de intervenções breves no uso de álcool e o nível de aplicação pelos enfermeiros e a ligação da assistência de enfermagem oferecida pelos enfermeiros aos pacientes alcoolistas com o seu nível de qualificação. A diversificação temática é considerável, no entanto, um bom número de artigos pontuou uma preocupação de seus autores quanto a assistência e a formação dos enfermeiros diante do cuidado aos pacientes que fazem uso abusivo do álcool.

            Já o número de amostras utilizadas para compor o corpo de conhecimentos dos artigos analisados demonstrou uma tendência para a pesquisa de abordagem quantitativa com amostras acima de quinhentos (500) participantes, artigo este relacionado a formação de enfermeiros quanto ao conhecimento adquirido sobre os problemas relacionados ao uso do álcool. A menor amostra, constou de uma pesquisa bibliográfica que buscou na literatura sobre o uso abusivo do álcool dezesseis (16) publicações (catorze artigos e duas teses). Embora a tipologia de uma pesquisa não saliente a fidedignidade de seus resultados, observa-se uma preocupação de seus autores em demonstrar estatísticamente que a utilização do álcool é uma preocupação para os enfermeiros, bem como uma necessidade em se provar que a assistência dada aos pacientes alcoolistas é incipiente e reflexo de uma deficiência da educação formal destes profissionais.

            Quanto a tipologia do estudo, as pesquisas revelam do ponto de vista dos seus objetivos, uma tendência para os estudos de pesquisa descritiva (05), exploratória (01) combinada com a pesquisa descritiva, além de uma classificação própria quanto ao objeto dos estudos que é a classificação de pesquisa bibliográfica(04).

            Entende-se como pesquisa descritiva aquela que privilegia os fatos observados, registrados, analisados, classificados e interpretados, sem que o pesquisador interfira neles; os fenômenos do mundo físico e humano são estudados, mas não manipulados pelo pesquisador20. Já a pesquisa exploratória proporciona maiores informações sobre determinado assunto, além de facilitar a delimitação de um tema de trabalho, definir os objetivos ou formular as hipóteses de uma pesquisa como também descobrir novo tipo de enfoque para o trabalho que se tem em mente20. Através da pesquisa exploratória avalia-se a possibilidade de desenvolver uma boa pesquisa sobre determinado assunto20.

            A partir dos achados, entende-se que a maioria dos estudos utilizados para compor esta pesquisa não apresenta uma caracterização fidedigna ao sistema classificatório preconizado pelos autores de obras de metodologia científica. Os artigos analisados, em sua maioria, apresentam uma classificação distorcida e por vezes errônea. Um bom exemplo é a utilização do uso da técnica empregada pelo pesquisador no processo investigativo (psicometria) para caracterizar o estudo. Entende-se por psicometria um conjunto ou qualquer dos métodos quantitativos em psicologia; instrumento pelo qual se propõe a apreciar as faculdades morais e intelectuais do homem21.

            Outro exemplo de emprego errôneo é a classificação dos estudos como pesquisa bibliográfica ou mesmo de revisão de literatura como um sistema particular de classificação quando não o é. A pesquisa bibliográfica bem como a de laboratório e a de campo fazem parte de um sistema de classificação quanto ao objeto. Daí, entende-se como pesquisa bibliográfica o primeiro passo para todo o trabalho científico; costuma abranger toda bibliografia já tornada pública em relação ao tema de estudo, desde publicações avulsas, boletins, jornais, revistas, livros, pesquisas, monografias, teses, material cartográfico etc., até meios de comunicação orais: rádio, gravações em fita magnética e audiovisuais: filmes e televisão. Sua finalidade é colocar o pesquisador em contato direto com tudo o que foi escrito, dito, ou filmado sobre determinado assunto, inclusive conferências seguidas de debates que tenham sido transcritos por alguma forma, quer publicadas, quer gravadas20,22.

            Quanto aos instrumentos utilizados para a construção dos artigos, observa-se o predomínio dos estudos de revisão bibliográfica(6) com utilização de consulta sistemática a base de dados; questionários(3) aplicados e a construção de uma escala para mensuração de atitudes dos enfermeiros diante dos pacientes alcoolistas.

            A pesquisa revelou que os estudos abordaram uma grande variedade de temáticas e os achados apontam para conhecimentos relacionados as deficiências reveladas na educação formal entre os alunos de graduação de enfermagem que futuramente vão apresentar crenças e atitudes negativas diante dos pacientes alcoolistas; conhecimentos relacionados a epidemiologia de populações usuárias de álcool bem como de outras drogas; propostas de avaliação clínica da síndrome de abstinência através de escalas com base nas manifestações clínicas, além de intervenções de enfermagem para seu combate; condutas terapêuticas por parte dos enfermeiros, a partir da credibilidade do alcoolismo como doença; diminuição de publicações a partir da década de 90 sobre o consumo de álcool; a violência no serviço de emergência revelada pelos enfermeiros a partir de agressões sofridas pelos pacientes alcoolizados; reconhecimento na determinação, prevenção e tratamento de pacientes que fazem uso do álcool e outras drogas; reconhecimento das intervenções de enfermagem como atividades que propiciam a assistência aos pacientes alcoolistas como também uma legitimação do papel do enfermeiro no cenário assistencial e, finalmente, a qualificação do enfermeiro como base para o aconselhamento e novas atitudes diante do cuidado do paciente alcoolista.

            A partir da análise da literatura revisada observa-se uma tendência discreta para os estudos que demonstram a falta de preparo dos enfermeiros no atendimento aos pacientes usuários de álcool, evidenciando comportamentos preconceituosos em virtude da falta de conhecimento e da capacitação deste profissional, como a chave para uma assistência de qualidade. Do mesmo modo, alguns artigos abordam a utilização abusiva do álcool como provedora de uma série de transtornos passíveis de intervenções.

            Os artigos coletados apresentam um conhecimento teórico importante para a capacitação do enfermeiro, no entanto, acentua uma lacuna muito maior a partir do que é realizado por este profissional. A experiência tem demonstrado que o trabalho no Setor de Emergência é difícil devido ao sucateamento que os hospitais públicos sofrem em função da falta de recursos, além do desestímulo de seus profissionais. Tal medida, na maioria das vezes, inviabiliza qualquer metodologia científica que implemente a assistência ao paciente alcoolista como qualquer outro que careça de assistência.

            Embora a atuação do enfermeiro, no setor de emergência, chegue a ser caótica, é possível o desenvolvimento de algumas atividades simples que possibilitem a recuperação dos pacientes, a partir do atendimento inicial, bem como ações futuras objetivando a sua cura.

            A literatura consultada pouco contribuiu para fornecer bases para a melhoria da assistência aos pacientes alcoolistas. No entanto, observa-se em alguns artigos consultados  breves intervenções no atendimento deste paciente. São consideradas breves intervenções todas as práticas que investigam um problema potencial e motivam um indivíduo a iniciar uma espécie de ação de mudança a cerca de um problema7. O objetivo fundamental de qualquer intervenção breve é reduzir as chances e condições que favoreçam o desenvolvimento de problemas relacionados ao uso de substâncias. As metas são estabelecidas para cada paciente, individualmente, a partir da clara identificação do seu padrão atual de consumo e os riscos associados23 .

            As breves intervenções preconizadas em 60% da literatura consultada demonstram uma preocupação de seus escritores em apontar para um tipo de assistência não sistematizada e, nem sempre, denominada de enfermagem. Alguns artigos chamam de aconselhamento ou estratégias de aproximação algumas ações nitidamente de enfermagem, que nem sempre são desempenhadas por enfermeiros que as executam.

            A partir da busca por uma metodologia que propicie uma assistência de qualidade, identificamos as taxonomias dos diagnósticos, intervenções e resultados de enfermagem. Uma taxonomia caracteriza-se por uma organização sistemática, com base em semelhanças e no que pode ser considerado um arcabouço conceitual. Define-se diagnóstico de enfermagem como um julgamento clínico sobre as respostas do indivíduo, da família ou da comunidade a problemas de saúde/processos vitais reais ou potenciais. O diagnóstico de enfermagem proporciona a base para a seleção das intervenções de enfermagem para atingir resultados pelos quais a enfermeira é responsável (aprovado na 9ª Conferência, 1990)24. Já as intervenções de enfermagem são consideradas como qualquer tratamento, baseado no julgamento clínico e no conhecimento, realizado por uma enfermeira para aumentar os resultados obtidos pelo paciente/cliente25. Os resultados revelam que é um estado variável do cuidado do paciente ou família, comportamento, ou percepção que é responsiva às intervenções de enfermagem e conceituação em níveis médios de abstração26.

            A literatura consultada não apresentou nenhuma estrutura sistematizada para compor a assistência aos pacientes alcoolistas. Daí, um bom exemplo para esta estrutura, sugerimos o diagnóstico de enfermagem processos familiares, alterados: alcoolismo.

Diagnóstico de Enfermagem: Processos Familiares, Alterados: Alcoolismo27.   Definição:  O estado no qual as funções psicossociais, espirituais e fisiológicas da unidade familiar estão cronicamente desorganizadas, levando ao conflito, à negação dos problemas, à resistência de mudanças, à resolução ineficaz de problemas e a uma série de crises autoperpetuadas. 

            Resultado: Enfrentamento Familiar

Principais Intervenções

Intervenções Sugeridas

Intervenções Opcionais

Aumento do Enfrentamento

Manutenção dos Processos Familiares

Tratamento do Uso de Substâncias

 

Proteção e Apoio contra o Abuso

Proteção e Apoio contra o Abuso na criança, cônjuge e idosos

Intervenção nas Crises

Aconselhamento

Promoção da Integridade Familiar

Apoio Familiar

Promoção da Normalização

Apoio Espiritual

Apoio Grupal

Assistência para o Controle da Ira

Controle Comportamental

Treinamento para o Controle dos Impulsos

Consulta

Aumento da Auto-consciência

Facilitação da Auto-responsabilização

 

            Resultado: Funcionamento Familiar

Principais Intervenções

Intervenções Sugeridas

Intervenções Opcionais

Promoção da Integridade Familiar

Manutenção de Processos Familiares

Tratamento do Uso de Substâncias

Controle Comportamental

Aconselhamento

Mobilização Familiar

Apoio Familiar

Terapia Familiar

Estabelecimento de Objetivos Mútuos

Promoção da Normalização

Prevenção do Uso de Substâncias

Aumento do Sistema de Apoio

Apoio e Proteção contra o Abuso

Assistência no Controle da Ira

Aumento do Enfrentamento

Apoio às Decisões Tomadas

Treinamento do Controle de Impulsos

Consulta

Facilitação da Auto-responsabilização

Apoio Espiritual

Apoio Grupal

            Resultado: Conseqüências do Vício de Substâncias

Principais Intervenções

Intervenções Sugeridas

Intervenções Opcionais

Prevenção do Uso de Substâncias

Redução da Ansiedade

Controle Comportamental

Controle Comportamental: Esforço Próprio

Modificação Comportamental

Modificação Comportamental: Capacidades Sociais

Aumento do Enfrentamento

Aconselhamento

Intervenção nas Crises

Apoio Emocional

Promoção do Envolvimento Familiar

Mobilização Familiar

Apoio Familiar

Treinamento do Controle de Impulsos

Estabelecimento de Limites

Estabelecimento de Objetivos Comuns

Comprometimento do Paciente

Aumento da Auto-consciência

Aumento da Auto-estima

Assistência na Auto-mudança

Facilitação da Auto-responsabilização

Apoio Espiritual

Apoio Grupal

Aumento do Sistema de Apoio

Ensino: Processo/Doença

Terapia Grupal

Ouvir com Atenção

Assistência no Controle da Raiva

Aumento da Imagem Corporal

Construindo um Complexo de Relacionamento

Apoio nas Decisões Tomadas

Controle Ambiental

Terapia Familiar

Controle do Humor

Relaxamento Muscular Progressivo

Aumento da Socialização

 

            Os autores utilizados para esta pesquisa, dentro da variedade das temáticas, apresentam algumas reflexões sobre os conteúdos relacionados ao uso abusivo do álcool e a necessidade de treinamento formal e informal da equipe de enfermagem na tentativa de melhorar a assistência, a partir da qualificação de seus profissionais. A produção dos enfermeiros sobre o tema também revela que apenas 3,4 % dos artigos levantados, a partir dos descritores, foram produzidos por enfermeiros. Um outro achado, a partir da conclusão dos autores, é que o corpo de conhecimento produzido pelos enfermeiros tem contribuído para a melhoria da assistência de enfermagem aos pacientes portadores da síndrome de abstinência, como também a influência deste conhecimento na mudança de atitudes dos profissionais enfermeiros, em reconhecer o alcoolismo como doença, evitando condenação e julgamentos preconceituosos, o que sem dúvida repercutirá no tratamento destes doentes. Uma outra reflexão sobre a temática demonstrou que as pesquisas que envolvem a cirrose hepática alcoólica sofreram uma mudança no seu perfil passando de estudos superficiais sobre etiologia e fisiopatologia para estudos que evidenciam diagnósticos para aprofundamento acerca das complicações e dos tratamentos. Uma outra abordagem dentro da conclusão dos autores sugere que os cursos de enfermagem ministram o conhecimento sobre a utilização das drogas, no entanto, depois de formados os profissionais, contraditoriamente passam a guardar um grande distanciamento entre a teoria e a prática. Um dos estudos retrata a violência dos pacientes alcoolistas contra enfermeiros. Embora seja um artigo estrangeiro, observa-se que no corpo de conhecimentos no Brasil, esta temática é pouco conhecida e discutida. A sugestão do autor é a estratégia de tornar pública a agressão tanto para a instituição quanto para a sociedade. Embora tenham sido encontrados artigos que pontuam que os alunos recebem instrução sobre o assunto, outros diagnosticam o contrário e sugerem mudanças na grade curricular para que contemplem conteúdos sobre o abuso de álcool e outras drogas.

            Alguns autores sugerem, ao concluírem suas pesquisas, que os enfermeiros precisam de atualização nas questões que abordam a utilização do álcool. Finalmente, um dos autores estrangeiros menciona as intervenções breves, que já são estabelecidas na literatura, e que são pouco exploradas pelos enfermeiros brasileiros. 

CONSIDERAÇÕES FINAIS           

            A partir da literatura consultada para a formulação desta pesquisa, observa-se, dentro de um grande universo de temáticas, a pouca valorização do cuidado. Os autores se preocupam em diagnosticar os motivos da falta de conhecimento dos enfermeiros sobre o assunto, além da violência das agressões praticadas pelos usuários de álcool contra os profissionais, a necessidade de atualização destes, o preconceito no atendimento dos pacientes alcoolistas, a pouca literatura escrita por enfermeiros, dentre outras. Embora, o fenômeno da busca de uma metodologia assistencial para todo e qualquer paciente, que careça de cuidados de enfermagem, tenha se iniciado em meados do século passado, mais precisamente na década de 50, os enfermeiros aprendem nos cursos de graduação a história da construção dessa metodologia, a sua importância, como utilizá-la e novas tendências. No entanto, no dia a dia os profissionais de enfermagem não conseguem colocar todo este conhecimento em prática. Os motivos de tal atitude certamente, revelariam um outro estudo, pois o paciente alcoolista é mais um dependente de cuidados, com base em diagnósticos fiéis aos fenômenos que evidencia e intervenções de enfermagem que revelem resultados positivos e que justifiquem sua recuperação. No nosso entender, não percebemos uma preocupação concreta em estabelecer, pelo menos, um protocolo de atendimento aos usuários de álcool que garanta o seu restabelecimento. A bibliografia revelou uma única fonte que preconiza “breves intervenções” que, embora sinalizem para uma estrutura protocolar de atendimento, necessitam, ainda, de maiores investigações para serem anexadas ao corpo de conhecimentos da Enfermagem e utilizadas pelos seus profissionais. 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 

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