Especialização Enfermagem em Cuidados Intensivos – análise de
incidente crítico no processo ensino-aprendizagem-avaliação
Profa. Dra. Isabel CF da Cruz – Coordenadora
. Breve descrição do contexto:
O curso de especialização em
Enfermagem em Cuidados Intensivos, foi criado em 1994, pela Profa. Dra Isabel
Cruz, tendo até o momento formado 22 turmas. Desde 2009, o acompanhamento
andragógico d@s pós-graduand@s acontece também pelo Ambiente
Virtual de Aprendizagem (plataforma Moodle). O curso, sediado no Departamento de
Enfermagem Médico-Cirúrgica, tem na sua equipe professores doutor@s, doutorand@s
e mestres da EEAAC.
O projeto andragógico
do curso é centrado n@ pós-graduand@, enfermeir@. O objetivo principal é
capacitar para o cuidado interdisciplinar e colaborativo para @ cliente de ata
complexidade, com base em evidência científica. Neste sentido, a parte teórico-prática
é desenvolvida em serviço e o trabalho de conclusão de curso (TCC) é baseado
em aprendizagem por projeto para resolução de problema, cujo produto, um
artigo científico, quando aprovado, é publicado no Journal
of Specialized Nursing Care.
. Descrição do problema:
A diferença de expectativa entre o
projeto didático-andragógico do Curso e @s pós-graduand@s expressa em carta
na qual manifestam “sentimento de insegurança e insatisfação" e
requerem providências para melhorar o ensino oferecido. Como geralmente as
discussões e propostas sobre modelos de ensino na área da saúde ainda não
foram efetivadas na maioria das Universidades[1],
a diferença de expectativas é um problema potencial entre alun@s e docentes.
. Medidas chaves para a mudança (ou
melhoria):
Na referida carta, @s pós-graduand@s não
apontam o que constituiria mudanças ou melhoria no ensino. Optaram por
relacionar as causas.
No meu entendimento, a carta deve ser
entendida como um incidente crítico. E, como tal, positiva ou negativamente,
suscita a reflexão sobre o que aconteceu e, talvez, revisar os eventos.
. Processo de obter dados:
O método que usarei para abordar a
diferença de expectativas é o de análise do incidente crítico[2]
buscando, dentro das limitações no uso da técnica, focalizar o evento (a
carta), a(s) resposta(s) ao evento e o(s) possível(is) resultado(s), visando o
entendimento de como o curso pode ser melhorado.
. Análise e interpretação:
As informações a seguir auxiliam tanto
no entendimento do problema quanto na busca de melhorias, tendo sido organizadas
conforme o referencial da análise de incidente crítico.
Objetivo geral do curso não é possível de ser alcançado.
A
cada ano o planejamento do curso é atualizado com base no que preconizam as
organizações nacionais e internacionais em Saúde e Educação Permanente.
Neste sentido, nas atualizações recentes, o curso integrou como referencial o
Marco para Ação em Educação Interprofissional e Prática Colaborativa, da
OMS[3].
A Organização Mundial da Saúde (OMS) recomenda a colaboração
interprofissional em educação e prática por ser uma estratégia inovadora que
desempenhará um papel importante na redução da crise mundial na força de
trabalho em saúde.
Ainda
que o curso não tenha sido configurado para ser oferecido a profissionais de
outras áreas da saúde, mantém-se a ênfase do interprofissionalismo e,
particularmente, da colaboração (profissional-cliente; profissional-família)
para propiciar o cuidado de alta complexidade eficaz e melhorar os resultados na
saúde.
Contudo,
o projeto andragógico do curso enfatiza o cuidado de enfermagem baseado em evidência.
Há 22 anos, a atividade do TCC especificamente tem como referencial metodológico
a Saúde Baseada em Evidência e como estratégia de ensino a aprendizagem
baseada em projeto para a resolução de problemas[4].
O
TCC é uma atividade colaborativa d@ pós-graduand@ com a Coordenação de curso
que determina a cada turma um protocolo de pesquisa bibliográfica sobre questões
de saúde d@ cliente de alta complexidade[5].
Além da “Apostila de Orientação sobre o TCC”, há um bloco teórico na
forma de 2 oficinas (projeto & comunicação oral). Como esta atividade deve
ser realizada concomitante ao bloco teórico e teórico-prático, ao longo de 2
semestres letivos acontecem no AVA atividades de aprendizagem relacionadas às
etapas do projeto, constituindo uma estratégia de avaliação formativa.
O
produto final, isto é, o TCC deve ser na forma de um artigo científico para
publicação em periódico. Desde 2008, o Journal of Specialized Nursing Care é
um recurso para o aprendizado sobre submissão, revisão e publicação de
artigos em periódico científico online, bem como um veículo para divulgação
do TCC d@ pós-graduand@ vinculado aos cursos de especialização coordenados
pelo NEPAE-NESEN. Isto porque o compartilhamento
social do conhecimento é um princípio norteador do projeto andragógico
deste curso.
Assim,
no que se refere ao objetivo geral, cabe ressaltar que o processo educativo não
começa e nem se esgota na sala de aula ou no tempo do cronograma de um curso. O
objetivo geral do curso não é ambicioso. É o que se preconiza para a Atenção
à Saúde e @ profissional deve ser preparad@ para fazer este objetivo ser
realidade no cuidado diário d@ paciente de alta complexidade.
A
plataforma de acesso é confusa e desorganizada
Uma
vez que o planejamento do curso segue recomendações das instituições
nacionais e internacionais sobre Educação Permanente de profissionais de saúde,
uma competência central da formação, desde 2003, é o uso de informática[6].
Para
tanto, o curso utiliza o mesmo programa aberto que é adotado pela Rede Telessaúde
Brasil,
e pela Universidade Aberta
do SUS
(UNA-SUS), ambas do Ministério da Saúde. A saber: o MOODLE (Modular Object-Oriented
Dynamic Learning Environment - Ambiente de Aprendizagem Dinâmica
Modular Orientada a Objeto) é um software livre, de apoio à aprendizagem,
executado num ambiente virtual.
Este sistema de gestão da
aprendizagem, em trabalho colaborativo, está acessível na internet para @ pós-graduand@
nas 24 horas, 7 dias da semana, em qualquer dispositivo eletrônico, inclusive
telefone celular. Por meio dele praticamente não há distância entre @ pós-graduand@
e a Coordenação.
O material de apoio é limitado
Infere-se de que a expectativa de
maior quantidade de material de apoio se deva ao fato de que no ambiente virtual
de aprendizagem do curso de Enfermagem em Cuidados Intensivos não são
disponibilizadas “apostilas” ou diapositivos das aulas ministradas.
O planejamento do curso é baseado em
experiências de aprendizagem. Portanto, no AVA do curso há atividades de
aprendizado, tais como fóruns (gerar grupos de discussão entre os alunos),
links para sites de interesse, estudos dirigidos na forma de lições ou
questionários (maior interatividade), entre outras atividades cognitivas
que permitem a aprendizagem colaborativa (laboratório de avaliação, por ex).
Como o curso não é baseado em
apostila, foi adotado livro texto de referência na área de Cuidados Intensivos[7].
Não avaliação da atividade docente
Uma justa demanda.
Na certeza de que a prática
colaborativa é uma estratégia para desenvolver ambientes de trabalho terapêuticos,
considero necessário aprendermos a realizar a “crítica cuidadosa[8]
& criteriosa”. O feedback ou retroalimentação, em especial a negativa,
é fundamental porque quando feita direta e pessoalmente, em particular, ajuda a
pessoa sob análise a melhorar seu desempenho. Todavia, quando feito de forma
inconsequente, o feedback transforma-se em crítica vazia, suscetível de
provocar animosidade em quem recebe.
Ainda
que a avaliação seja parte inerente do processo ensino-aprendizagem, no curso
não se realiza nenhuma avaliação da atividade docente. Ainda que tod@s @s
colaborador@s nestes 22 anos do curso de especialização em Enfermagem em
Cuidados Intensivos tenham sido convidad@s pela Coordenação por sua expertise
na área, a avaliação cuidadosa & criteriosa só tende a melhorar o
desempenho d@ profissional.
Neste
sentido, será instituída a avaliação da atividade de ensino ao término da
aula, por meio do recurso pesquisa no AVA, onde além do conhecimento e eficácia
d@ docente, serão coletadas informações sobre recursos materiais e online,
impacto do ensino para melhoria da competência, desempenho ou resultados d@
paciente, entre outros tópicos.
O
curso não alia teoria e prática
No
planejamento do curso 2 elementos são centrais: enfermeir@ & paciente de
alta complexidade. Para tanto, a recomendação para @s docentes é que conteúdos
e experiências de aprendizagem focalizem o cuidado direto d@ enfermeira para @
paciente.
Várias
experiências de aprendizagem oferecidas no AVA são baseadas em Estudos de
Caso, Resolução de Problemas e, na medida do possível, simulações online.
Além
disso, o projeto andragógico do curso é dirigido para @ enfermeir@que já atua
nas Unidades de Saúde de Alta Complexidade oferecendo a modalidade “Treinamento
em Serviço” para que @ profissional refletisse sobre sua prática e
passasse a incorporar as evidências científicas no cuidado cotidiano. Além
disso, esta modalidade, mais flexível, se adequa às condições de tempo e
disponibilidade d@ profissional.
Por
questões que não cabem aqui discutir, a área de alta complexidade em saúde
exerce uma atração em estudantes, recém-formados e profissionais que atuam em
outras áreas[9].
Todavia, quando enfermeir@s que não estão diretamente atuando com clientes de
alta complexidade manifestam interesse em cursar lhes são apresentadas as condições
explicitamente no contrato de prestação de serviços (pré-matrícula) e na
Apostila Orientadora do Treinamento em Serviço (pós-matrícula).
Contudo,
a demanda é pertinente, em que pese os esforços desta Coordenação para o
ensino do cuidado de enfermagem centrado na pessoa. Minha sugestão é que a
EEAAC e demais faculdades da área da saúde, na Universidade Federal
Fluminense, com a ajuda da Associação
Brasileira de Simulação na Saúde, criem (ou se associem a) um centro
interprofissional de simulação em cuidados de saúde para capacitação ou
atualização de profissionais e alun@s.
Interação
ou interatividade com a Coordenação?
Interação
envolve troca e interatividade envolve contato com tecnologias. Não são sinônimos
nem antônimos, mas o evento sugere que as pessoas ainda precisam de mais tempo
para aceitar as novas formas de comunicação, de troca, de interação que não
incluem necessariamente a presença física, mas que podem ser muito efetivas.
Mas
se o contato e a troca existem mediados por tecnologias de informação e
comunicação, por que persiste a demanda pela presença física como condição
de interatividade?
Minha
experiência como Coordenadora de um curso com um projeto andragógico
diferenciado me permite apontar como algumas das causas prováveis da
dificuldade de interação:
-
a procrastinação acadêmica e o choque de aprendizagem[10]
Com
base no princípio da aprendizagem colaborativa, para superar estes problemas, a
Coordenação investe na aprendizagem auto-regulada (lições e estudos
dirigidos individualizados na forma de questionários) e reflexão pública (fóruns),
por meio do AVA. Todavia, como a procrastinação é praticamente um hábito
nacional, as vivências de aprendizagem neste curso de 360 horas não são
suficientes, por vezes, nem para aflorar à consciência o problema, quiçá,
modificar uma “rotina institucional”. Daí, uma barreira à interatividade e
à interação.
Uma
vez que a procrastinação é um comportamento nocivo para @ profissional de saúde,
em especial, esta Coordenação enfatiza para @s discentes os valores
profissionais de pontualidade,
assiduidade, entre outros e exige o cumprimento das atividades de aprendizagem
em tempo hábil porque a gestão eficaz do tempo também é uma competência
profissional.
. Estratégias para mudanças:
Realmente,
precisamos mudar. Urgente. Da parte desta Coordenação, tendo em vista que a prática
baseada em evidência é um estado de perpétua incerteza e mudança contínua,
temos que:
-
incrementar as atividades de aprendizagem experienciais sobre a ética do
cotidiano no contexto do cuidado de alta complexidade
-
buscar parcerias para as experiências de aprendizagem com simulações em saúde
. Próximos passos:
Consideramos
que para melhorar o processo de ensino-aprendizagem do curso de Especialização
em Cuidados Intensivos, por meio da crítica cuidadosa & criteriosa d@ pós-graduand@,
é preciso instituir a avaliação da experiência de aprendizagem de forma
regular.
Consideramos
também a possibilidade de testar com @s docentes colaborador@s a estratégia
“Sala de Aula Invertida (flipped classroom)” de modo que o bloco teórico
possa ser desenvolvido na modalidade de “oficinas de prática de resolução
de problemas d@ paciente de alta complexidade”.
Todos
os esforços devem ser envidados para que as expectativas d@s pós-graduand@s
convirjam para o projeto andragógico do curso.
. Referências
[1]
Trindade, Leda Maria
Delmondes Freitas, & Vieira, Maria Jesia. (2009). Curso de Medicina:
motivações e expectativas de estudantes iniciantes Medical School:
motivations and expectations of incoming students.Revista Brasileira de
Educação Médica, 33(4), 542-554. Retrieved September 23, 2015, from
http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0100-55022009000400005&lng=en&tlng=pt.
10.1590/S0100-55022009000400005.
[2]
Ribeiro Luana Cássia
Miranda, Souza Adenícia Custódia Silva e, Barreto Regiane Aparecida dos
Santos Soares, Neves Heliny Carneiro Cunha, Barbosa Maria Alves. Técnica de
incidente crítico e seu uso na Enfermagem: revisão integrativa da
literatura. Rev. bras. enferm. [Internet]. 2012 Feb [cited
2015 Sep 22] ; 65( 1 ): 162-171. Available from: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0034-71672012000100024&lng=en.
http://dx.doi.org/10.1590/S0034-71672012000100024.
[3]
OMS- Marco para Ação em Educação Interprofissional e Prática
Colaborativa, 2010, disponível em http://www.paho.org/bra/images/stories/documentos/marco_para_acao.pdf%20
[4]
Camillis, Patricia
Kinast de, & Antonello, Claudia Simone. (2010). Um estudo sobre os
processos de aprendizagem dos trabalhadores que não exercem função
gerencial. RAM. Revista
de Administração Mackenzie, 11(2),
4-42. Retrieved September 22, 2015, from http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1678-69712010000200002&lng=en&tlng=pt.
10.1590/S1678-69712010000200002.
[5]
Cruz ICF. Pesquisar se aprende pesquisando... relato da experiência de um
programa de metodologia da pesquisa de enfermagem. Rev Enferm UERJ 2001;
9(3): 270-6.
[6]
The
Core Competencies Needed for Health Care Professionals, chapter 3. In:
Health
Professions Education: A Bridge to Quality. Disponível em http://www.ncbi.nlm.nih.gov/books/NBK221519/
[7]
Morton,
P et al – Cuidados Críticos de Enfermagem – uma abordagem holística. 9ª. Ed,
RJ, Guanabara Koogan, 2011
[8]Ferrazzi,
K – Fanqueza, crítica e trabalho em equipe.Harvard Business Review, jan,
2012. Disponível em http://hbrbr.com.br/franqueza-critica-e-trabalho-em-equipe/
[9]
Borges, A et al Caracterização e
expectativas de estudantes ingressantes de um curso de graduação em
enfermagem. Espaço para a Saúde 12(1), 2010. Disponível
em
http://www.uel.br/revistas/uel/index.php/espacoparasaude/article/view/9230
[10]
Villardi, Beatriz
Quiroz, & Vergara, Sylvia Constant. (2011). Implicações da
aprendizagem experiencial e da reflexão pública para o ensino de pesquisa
qualitativa e a formação de mestres em administração.Revista de
Administração Contemporânea, 15(5),
794-814. Retrieved September 22, 2015, from http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1415-65552011000500002&lng=en&tlng=pt.
10.1590/S1415-65552011000500002.
Apontamentos
- Não há apontamentos.
BNN - ISSN 1676-4893
Boletim do Núcleo de Estudos e Pesquisas sobre as Atividades de Enfermagem (NEPAE)e do Núcleo de Estudos sobre Saúde e Etnia Negra (NESEN).