RELAXAMENTO
MUSCULAR PROGRESSIVO: prescrição de enfermagem para o diagnóstico de
ansiedade pré-operatória.[1]
Isabel
Cristina F. da Cruz[3]
Resumo: Neste estudo temos por objetivo identificar as
características definidoras de ansiedade e avaliar a eficácia do relaxamento
psicossomático, enquanto prescrição de enfermagem. A amostra foi composta por
5 clientes adultos, do pré-operatório da cirurgia cardíaca, de um Hospital
Universitário do RJ. As entrevistas foram realizadas com o auxílio de 2
questionários (histórico inicial e avaliação final) e posteriormente
transcritas e analisadas pelas pesquisadoras. Foram identificadas as seguintes
categorias: sentimento enquanto aguarda a cirurgia, preocupações vividas no pré-operatório,
estratégias utilizadas pelo cliente para reduzir a ansiedade, sentimento ao
realizar as sessões de relaxamento, diferença entre antes e depois do
relaxamento e efeitos das sessões de relaxamento no período de internação pré-cirúrgica.
Concluímos que houve uma relação positiva entre o conteúdo dos depoimentos e
o referencial conceitual utilizado neste estudo.
Unitermos:
Ansiedade - diagnóstico de enfermagem - relaxamento psicossomático.
A experiência da internação
hospitalar e da cirurgia precipitam sentimentos e reações estressantes que
fazem as pessoas sentirem-se vulneráveis e descontroladas. Tendo em vista a
conexão estreita entre o corpo e a psique, qualquer dano feito a um deles
parece afetar o outro; assim como qualquer ação que vise a saúde de um deles
parece ter efeitos benéficos no outro.
Dentre as reações estressantes
vividas pelo cliente internado em um hospital, particularmente aquele que irá
se submeter à cirurgia, destacamos a ansiedade.
Enquanto um diagnóstico de
enfermagem, a ansiedade é definida como um estado subjetivo no qual o indivíduo experimenta um sentimento de
incômodo e inquietação, cuja fonte é freqüentemente, inespecífica ou
desconhecida por ele (NOBREGA, GARCIA; 1992)
Ainda que haja controvérsias sobre
o diagnóstico de enfermagem e mais ainda sobre se ansiedade é um fenômeno que
a enfermeira deve diagnosticar e tratar com autonomia, observamos no
levantamento bibliográfico feito que as pesquisas sobre a utilização de diagnósticos
de enfermagem evidenciam a ansiedade como uma ocorrência freqüente, ocupando o
oitavo lugar na freqüência dos diagnósticos identificados (WHITLEY,
1990)
Apesar de sua causa ser desconhecida
ou não específica na origem, os indicadores de ansiedade podem ser observados
e identificados pela enfermeira durante o seu trabalho, por meio de respostas
comportamental/psicológica dos clientes, tais como: a presença de incerteza,
sentimento de desassossego, desconforto, pânico, irritabilidade, nervosismo,
aumento da pressão arterial, pulsação, tesão facial, dispnéia, entre
outras. Ou ainda pelo relato individual que inclui medos de conseqüências
inespecíficas, incerteza e sentimento de incapacidade.
As conseqüências da vivência da ansiedade
incluem mudanças comportamentais de ajuda e resposta que podem ser tanto
positivas quanto negativas, de procura de soluções, de fuga ou de negação,
é o chamado Mecanismo de Enfrentamento do Estresse (BECKET, 1991)
Da mesma forma que cresce o
interesse sobre os diagnósticos de enfermagem, aumenta também o interesse das
enfermeiras na utilização de práticas não-farmacológicas para a resolução
dos diagnósticos identificados ou para a manutenção e a recuperação da saúde.
Embora neste campo as pesquisas ainda estejam em fase inicial, vemos nele um
enorme potencial a ser desenvolvido pelas enfermeiras, vindo a construir um
corpo de conhecimentos que permita ações independentes da prática médica.
Neste sentido, entendemos que é
possível a enfermeira identificar as características definidoras de ansiedade
que pertencentes à esfera psicobiológica do cliente, visando a busca do alívio
ou minimização desses sinais e sintomas e a diminuição das expectativas do
pré e pós-operatório.
Assim, para o tratamento da
ansiedade do cliente pela enfermeira de modo autônomo e independente,
destacamos as técnicas de relaxamento uma vez que elas podem diminuir a
ansiedade, tônus muscular, fadiga e aliviar a dor. Uma pessoa treinada para o
relaxamento pode, em 10 minutos, alcançar serenidade, diminuir a ansiedade e
tornar a respiração mais tênue, ritmada, inaudível e profunda (PIMENTA,
1992).
Por evidenciarmos em nosso local de
atuação um número significativo de clientes, internados na clínica cirúrgica
de um H.U., apresentando indicadores de ansiedade, sentimos a necessidade de
explorar a utilização de uma técnica não-farmacológica para a correção
deste diagnóstico. Neste estudo relatamos os resultados obtidos com a aplicação
de técnica de relaxamento psicossomático para clientes com o diagnóstico de
enfermagem ansiedade no pré-operatório
de cirurgia cardíaca.
REFERENCIAL
CONCEITUAL.
Ansiedade
enquanto diagnóstico de enfermagem.
O termo diagnóstico tem origem
grega e significa conclusão e julgamento resultante de um processo analítico.
Diagnóstico de Enfermagem para a North
American Nursing Diagnosis Association (
NANDA ) é o julgamento clínico das
respostas do indivíduo, da família ou da comunidade aos processos vitais ou
aos problemas de saúde atuais ou potenciais, os quais fornecem a base para seleção
das prescrições de enfermagem e para avaliação da assistência pela qual o
enfermeiro é responsável (YOSHIOCA et
al, 1993 ) .
A ansiedade para ser um diagnóstico
de enfermagem deve ser identificada e tratada com autonomia e/ou independência
pela enfermeira. Por entendermos que isto é plenamente possível, neste estudo,
a ansiedade é um diagnóstico de enfermagem.
Para poder chegar a formular o diagnóstico
é importante verificar se o cliente queixa-se ou apresenta, por exemplo, de
aumento de tensão, apreensão, preocupação, tristeza/angústia, receios,
nervosismo, pânico, sentimento de incapacidade, aumento da prostação,
super-excitação, irritabilidade, choro, indecisão, isolamento, entre outros
sinais.
A NANDA descreve as seguintes
características definidoras: tensão aumentada, apreensão, incapacidade
aumentada dolorosa e persistente, incerteza, medo, espanto, remorso, excitação
excessiva, tagarelice, angústia, nervosismo, sentimentos de inadequação,
tremores, temor de conseqüências inespecíficas, preocupações expressas de
novas mudanças em eventos da vida; preocupação e impaciência (NOBREGA,
GARCIA; 1992) .
No exame físico, a enfermeira pode
evidenciar no cliente com ansiedade indicadores tais como: aumento da pulsação,
da pressão sangüínea, da freqüência respiratória e da transpiração. Pode
apresentar ainda face ruborizada, dispnéia, tremores, pupila dilatada, boca
seca, voz trêmula, aumento da verbalização, tensão muscular, dor de cabeça,
insônia, anorexia, movimentos corporais e faciais (esfregar as mãos, cerrar os
dentes, contrair os músculos da face) , quando mediados pelo Sistema Nervoso
Simpático (SNS).
Se a atividade exacerbada é do
Parassimpático, o cliente apresenta diminuição do pulso, da pressão sangüínea,
dor abdominal, náusea, diarréia, aumento da freqüência urinária, entre
outras manifestações.
Quanto às características
definidoras objetivas, a NANDA relaciona as seguintes: respostas fisiológicas
à estimulação simpática - pele fria, taquicardia e dilatação da pupila,
inquietação, insônia, olhar ao redor, diminuição do contato olho-a-olho,
tremor das mãos, movimentos de automatismo, tensão facial, voz trêmula,
autofocalização, atenção e respiração aumentadas (NÓBREGA, GARCIA; 1992 )
.
Também pode ser observado no
cliente a dificuldade de concentração, a diminuição da habilidade para o
aprendizado e para a resolução de problemas, esquecimento e atenção alterada
( WHITLEY, 1990 ). Cabe ressaltar neste momento que o estado ansioso em que os
nossos clientes vivem, independente de sua causa, pode comprometer, e muito, as
atividades previstas sobre Educação em Saúde. Assim chamamos atenção para o
fato de ser necessário na abordagem inicial de nossa clientela identificar o
grau de ansiedade presente e os mecanismos de enfrentamento do estresse para, só
depois, introduzir as atividades de ensino do cliente.
A enfermeira também precisa para a
formulação do diagnóstico de ansiedade identificar os mecanismos
de enfrentamento do estresse. Quando positivos, vemos que o cliente aprova
os cuidados, procurando informações, buscando suporte social e religioso,
escolhendo opções para a resolução de seus problemas. Quando negativos,
observamos no cliente um comportamento de retirada, afastamento ou
distanciamento, resistência ou oposição ao cuidado. Entretanto, o mecanismo
de enfrentamento do estresse é francamente influenciado por componentes
interpessoais, pelo sistema social de apoio do cliente o que concorre para
sua eficácia, sua utilidade e sua coesão.
Daí ser necessário também
identificar os fatores que podem estar subjacentes à manifestação de
ansiedade. Segundo a NANDA, os fatores relacionados para a ansiedade são:
conflitos inconscientes de valores e metas essenciais da vida, ameaça no auto
conceito, ameaça de morte, ameaça ou mudança
no estado de saúde, na função social, no ambiente, na interação dos
padrões, ou ainda, crise situacional/existencial, contágio ou transmissão
interpessoaal e necessidades não atendidas ( NOBREGA, GARCIA; 1992 ).
A entrevista e o exame físico
sistematizados auxiliam a enfermeira na identificação das características e
fatores relacionados aqui descritos para o diagnóstico de enfermagem. Com base
nestes dados a enfermeira pode então estabelecer o diagnóstico e o que está
provocando a sua manifestação. Uma vez formulado o diagnóstico, inicia’se o
processo decisório sobre a prescrição mais adequada para a resolução da
ansiedade.
Há uma série de prescrições de
enfermagem sugeridas para o tratamento da ansiedade, a saber: técnicas de
tranquilização, promoção das estratégias de enfrentamento de estresse e
presença, entre outras (DALY, 1993). Neste estudo, avaliamos que a técnica do
relaxamento muscular progressivo seria ma mais adequada para tratar a ansiedade
nos clientes do pré-operatório de cirurgia cardíaca.
O
relaxamento muscular progressivo enquanto prescrição de enfermagem.
Concordamos com a definição de BULECHEK, Mc
CLOSKEY (1992) segundo a qual a prescrição de enfermagem é qualquer
cuidado direto que a enfermeira realiza em benefício de seu cliente e inclui os
tratamentos iniciados em função do diagnóstico de enfermagem, em função do
diagnóstico e do tratamento médico e em função das atividades diárias
essenciais do cliente.
Assim, o relaxamento muscular
progressivo, tendo em vista a nossa clientela e as condições ambientais do
Hospital Universitário onde foi realizado este estudo foi proposto como prescrição
de enfermagem para o diagnóstico de ansiedade.
A diminuição da tensão
(relaxamento) neuro-muscular acontece por meio da da indução psíquica. O
relaxamento muscular progressivo consiste em, segundo FRANÇA; RAHM (1984), em
concentrar e dirigir a atenção para cada parte do corpo de forma seqüencial
(cabeça, rosto, pescoço, ombro, braços, tórax, abdômen, pelve, pernas e pés).
Para cada parte que é dirigida a atenção, deve-se perceber a tensão e, em
seguida, procurar relaxar.
A pessoa ansiosa aumenta mais a tensão
por enviar à medula espinhal e ao cérebro mensagens de preparo do corpo para a
luta ou fuga. Conseqüentemente, o cérebro
envia aos músculos responsáveis pelo mecanismo de luta
ou fuga mensagens que intensificam a tensão nos mesmos. Instala-se,
portanto, um perigoso círculo vicioso. Ao relaxar progressivamente os músculos
muda-se a qualidade das mensagens que
retornam ao cérebro, uma vez que estas transmitem sensações de tranquilidade,
conseguindo-se assim a liberaração de energia para outra atividade (MITCHELL,
1983; PIETRONI, 1988).
Em se tratando de clientes com distúrbios
cardíacos, há uma hipótese segundo a qual as pessoas hiperreativas respondem
aos fatores estressantes com um metabolismo cardiovascular inadequado e
exagerado que as leva, por vezes, a uma hipertensão constante (POTEMPA, 1994).
Daí a importância do relaxamento muscular progressivo para esta clientela, em
particular. Uma vez relaxados os músculos (voluntários e involuntários) os
esforços do coração diminuem para bombear o sangue pelo sistema vascular por
não haver mais os embargos gerados pela tensão muscular. A flacidez muscular
induzida pelo relaxamento facilita a oxigenação e a desintoxicação dos
tecidos.
Os benefícios do relaxamento
muscular progressivo para o cliente cardíaco são destacados por TAYLOR (1992)
quando afirma que esses métodos são largamente observados como um elemento
central da administração do estresse, componente básico de um programa de
prevenção de cardiopatias. Estudos mostram que o relaxamento diminuiu a pressão
sangüínea, as catecolaminas no plasma e os níveis de colesterol. As
contra-indicações para este tipo de terapia são poucas ou quase nulas e as
precauções recomendadas estão relacionadas ao tipo de patologia e seus riscos
mais comuns, aos quais qualquer cliente está sujeito.
Quanto à técnica do relaxamento
muscular progressivo, verificamos na literatura que as seções de treinamento
envolvem na maioria das vezes uma combinação de várias metodologias, tais
como: imaginação controle de tensão muscular, estratégias de respiração,
entre outras.
As sessões de relaxamento podem ser
realizadas individualmente ou em sessões de grupo supervisionadas, mas os
clientes devem ser sempre encorajados a praticarem o relaxamento por eles mesmos
de modo que possam utilizá-las no seu cotidiano ( TAYLOR, 1992 ) .
Ao implementar o relaxamento
muscular progressivo com seus clientes a enfermeira deve observar alguns
aspectos da técnica. Primeiro deve-se cuidar para que o ambiente propicie a
indução do relaxamento. Deve ser minimizado o nível de barulho, de
luminosidade, de calor ou frio, entre outros fatores dispersivos.
O cliente deve ser orientado a
posicionar-se confortavelmente, afrouxando as roupas e fechando os olhos para
ajudar na redução da freqüência cerebral. Quanto ao posicionamento, este
pode ser de acordo com a cultura ou com o bem-estar de cada um. A técnica pode
ser realizada sentado em cadeira, no chão ou deitado em sofás, camas ou no chão.
Para clientes com dificuldade respiratória, a posição sentada pode ser mais
confortável.
A duração da sessão vai depender
das experiências prévias do cliente. É comum encontrar dificuldade de
concentração inicial onde a pessoa não suporta uma sessão por mais de 15 a
20 minutos. Mas, conforme vai se adquirindo condicionamento para relaxar, as
sessões podem aumentar a duração, chegando a 30 ou 40 minutos. Tempo superior
a este não é aconselhável pois pode induzir os clientes ao sono durante a
sessão.
Ainda que o relaxamento muscular
progressivo seja apontado por nós como a prescrição de enfermagem para tratar
a ansiedade, não excluímos, por exemplo, a possibilidade de outras formas de
tratamento principalmente para o cliente com severa ansiedade. Assim,
consideramos de igual relevância o suporte emocional, entendendo a necessidade
que o cliente tem de falar sobre seus pensamentos de ansiedade, de medo, entre
outros (CAY, 1986).
Ainda que a ansiedade seja um fenômeno
comum no cenário hospitalar, a sua compreensão como um diagnóstico de
enfermagem é relativamente recente. Mais recente ainda a utilização do
relaxamento muscular progressivo enquanto prescrição de enfermagem para o
cliente a ser submetido a cirurgia cardíaca. Portanto, consideramos importante
avaliar a eficácia deste tratamento para esta clientela.
MATERIAL
E MÉTODO
Neste
estudo coletamos dados descritivos sobre a eficácia do relaxamento muscular em
clientes no pré-operatório de cirurgia cardíaca.
Os
sujeitos da amostra
Os critérios utilizados para a
escolha dos clientes foram:
* tempo de permanência no hospital
que permitisse a realização da primeira entrevista, das duas sessões de
relaxamento propostas (dois dias), intervalo de 48 horas para que os clientes
pudessem executar a técnica sozinhos e entrevista final;
* clientes a ser submetidos a
cirurgia cardíaca; que estivessem em condições de responder às entrevistas e
participar das sessões;
* clientes que recebessem da
enfermeira pesquisadora o diagnóstico de ansiedade.
A amostra da pesquisa constituiu-se
de 5 clientes internados no setor de Clínica Cirúrgica, de um Hospital
Universitário da cidade do Rio de Janeiro. Os dados foram coletados no período
de 19 à 25 de outubro de 1994.
Todos os clientes foram
entrevistados após terem tomado ciência do conteúdo da pesquisa, por meio de
uma carta convite (Anexo I) e de um termo de responsabilidade (Anexo II), no
qual se comprometiam a dar sua colaboração para a pesquisa.
Instrumento
de coleta de dados
Para a entrevista inicial foi
elaborado um instrumento (Anexo III), com perguntas estruturadas e
semi-estruturadas. Este instrumento possui 4 partes. A primeira parte contém
dados demográficos ( nome, idade, religião, grau de escolaridade, profissão,
endereço dos clientes ) que podem representar fatores de influência para o
presente estudo como também servir
para contatos futuros.
A segunda parte contendo informações
sobrem sinais vitais, eliminações vesico-intestinais, aceitação das dietas,
ingestão hídrica e padrão de sono. A terceira, refere-se às possíveis
experiências cirúrgicas e suas intercorrências, assim como ao relato
individual sobre os sentimentos, sensações e preocupações presentes no
durante o período pré-operatório e às estratégias utilizadas para a redução
dessas preocupações. A quarta etapa trata sobre os itens de observação
referentes ao comportamento e às expressões dos clientes.
O instrumento foi elaborado com base
na literatura de modo a propiciar à enfermeira informações necessárias para
diagnosticar a ansiedade nesses clientes (NOBREGA, GARCIA; 1992 ).
Além do instrumento de coleta de
dados, como roteiro, utilizamos um gravador durante a realização das
entrevistas.
Procedimento.
Entre os clientes entrevistados,
cinco foram escolhidos por apresentarem o diagnóstico de ansiedade. O grupo de
5 clientes foi dividido em um sub-grupo de dois e outro de três clientes para a
realização das duas sessões de relaxamento muscular progressivo, com duração
de 40 minutos cada sessão.
Foi utilizada uma sala do Hospital
Universitário no mesmo andar onde os clientes encontravam-se internados. Esta
sala foi previamente preparada para a realização da técnica.
Para desenvolvimento da técnica de
relaxamento foi utilizado um gravador e uma fita cassete com música
instrumental selecionadaespecialmente para este estudo. Para a indução do
relaxamento, foi elaborado um texto com base na literatura especializada (MITCHELL,
1983; PIETRONI, 1988).
Antes de iniciar a sessão aguardávamos
alguns minutos, de acordo com a necessidade observada, para permitir a acomodação
do cliente no leito e a sua concentração. Feito isto fornecíamos orientações
para um melhor desenvolvimento e aproveitamento da técnica.
Após cada sessão, solicitávamos
aos clientes que expusessem os sentimentos vividos naquele momento. Também
incentivávamos a utilização da prática de relaxamento em outros horários ou
sempre que sentisse necessidade de reduzir os sentimentos desconfortantes.
Após um intervalo de dois dias
posteriores à última sessão de relaxamento, foi realizado uma segunda
entrevista individual, com auxílio do gravador, tendo por objetivo avaliar a
eficácia da prática do relaxamento muscular progressivo pelo cliente. Foi
utilizado como roteiro um instrumento elaborado para este fim contendo 3
perguntas (Anexo V). Resumidamente pedíamos aos clientes que descrevessem seus
sentimentos, sensações e as diferenças sentidas antes e após a realização
do relaxamento.
Os dados das entrevistas foram
transcritos e categorizados buscando pontos de semelhança entre os depoimentos
sobre a técnica de relaxamento muscular progressivo.
Foram identificadas as seguintes categorias: sentimento
enquanto aguarda a cirurgia, preocupações
vividas no pré-operatório, estratégias
para reduzir a ansiedade e percepção
sobre as sessões de relaxamento e sua eficácia.
As categorias foram discutidas à
luz do referencial conceitual e da literatura profissional.
ANÁLISE
E DISCUSSÃO DE DADOS.
A clientela foi composta por três
homens e duas mulheres, perfazendo um total de 5 clientes, com idade entre 32 e
56 anos.
Quanto ao grau de escolaridade, tivemos um cliente analfabeto, a
escolaridade máxima entretanto foi o 2º grau incompleto. Quanto à
religiosidade, todos declararam ser cristãos.
Quanto aos dados indicadores de
ansiedade, verificamos que dos cinco clientes entrevistados, três queixaram-se
de alterações fisiológicas como,
por exemplo, diarréia, anorexia e insônia.
Em relação as observações feitas
durante a entrevista, constatamos alterações comportamentais como
olhar abatido e desconfiado, auto confiança diminuída, extremidades
frias, face de preocupação, movimentos corporais aumentados ( deambulação )
, unhas roídas, tensão muscular, aumento das verbalizações, sudorese e
choro.
Dos cinco clientes, somente um não
havia tido experiências cirúrgicas anteriores. Os que tiveram experiência prévia
negaram intercorrências durante ou após cirurgia.
Nesta entrevista extraímos os
seguintes dados referentes ao sentimento enquanto aguarda a cirurgia:
(...) um pouco ansioso...me acostumando com a
idéia...”
(c1).
(...) fico
com pavor, fico temeroso, tenho medo de ir para lá e não voltar, medo de
morrer... se o Senhor me curasse... eu não precisaria fazer cirurgia. (c2).
Um
pouco ansiosa, ... tenho medo de operar e não acordar mais ... (c3).
Bastante preocupada, ... tenho fé em Deus
...” (c4).
Preocupação,
(...) a cirurgia não tem prazo, não sei quando vai acontecer, isto me deixa
preocupado. (c5).
Nestes segmentos dos depoimentos,
verificamos em todos as características definidoras do diagnóstico de
ansiedade e também do diagnóstico de medo, uma vez que
identificam a causa de sua preocupação que, neste caso, é a cirurgia.
Segundo MENEZES ( 1978 ) , o medo do
desconhecido é um dos principais problemas sentidos pêlos clientes e gerador
de angústia e ansiedade. Concordamos com KELLY ( 1974 ) , que o tipo de orientação
a ser dada também depende da experiência prévia do cliente em relação a
hospitalizações anteriores.
O pré-operatório é a fase onde o
cliente se acostuma com a idéia da cirurgia, ou seja, ele faz as adaptações
biopsicosociais necessárias. Porém, na falta de um relacionamento terapêutico
que vise o apoio psicológico, ou seja, orientação e esclarecimentos acerca da
cirurgia, permanece a fonte geradora de ansiedade.
A ansiedade pré-operatória é uma
resposta antecipada a uma experiência que ameaça o papel habitual do cliente
na vida ( FONTES, 1980 ) .
Os depoimentos dos clientes validam
o conceito do ambiente hospitalar como gerador de ansiedade e medo. Segundo
SILVA ( 1992 ) , o ambiente hospitalar desperta temor em virtude das pessoas
imaginarem-se em prenúncio de gravidade e próximas da morte. Neste estudo
particularmente os clientes temem a cirurgia que irá tocar em seus corações,
mas em um depoimento (c5) vemos que o problema apontado é a indefinição de
datas para a realização da mesma. Assim, o cliente sente-se à mercer da
equipe , sem direito a opinar ou planejar a sua vida o que, provavelmente, acaba
constituindo mais um estressor.
Verificamos nos depoimentos , referência
a uma força externa ( espiritualidade ) . Estes depoimentos validam o estudo de
HENSE (1988 ) , no qual o reconhecimento de um ser superior é algo que está presente no
transcorrer de toda a experiência do cliente cirúrgico, desde o momento em que
ele percebe a alteração na sua saúde até a alta hospitalar.
Quanto às preocupações
vividas no pré-operatório, destacamos os seguintes trechos dos
depoimentos:
(...) tenho medo da anestesia. Já ouvi dizer
que pessoas foram fazer cirurgias e com a anestesia tiveram parada cardíaca
(...) (c1).
(...)
pode acontecer comigo o que aconteceu com meus colegas de enfermaria, ser
operado, eu não sou melhor do que eles, e isso ajuda muito vê eles curados
... (c2).
Três clientes declararam não haver
nada os incomodando naquele momento. Quanto aos dois que manifestaram preocupação,
vemos que o cliente que vivência uma experiência cirúrgica, durante a fase pré-operatória,
é uma pessoa com grandes expectativas. Pode sentir-se inseguro e ansioso, ter
esperança de cura ou por outro lado, sentir medo do resultado.
Um aspecto interessante é o
seguimento do cliente em relação às experiências vividas pelos clientes
parceiros de enfermaria ou por pessoas próximas, quando essas são positivas,
diminuem a expectativa e ansiedade; porém, quando negativas, o cliente
experimenta sensações de medo e ansiedade crescentes.
Além do medo do desconhecido,
MENEZES é ( 1978 ) afirma que os clientes também têm medo de anestesia, da
cirurgia e da morte.
A afirmação de MENEZES é válida
pelos depoimentos da nossa clientela.
Quanto às estratégias
utilizadas pelo cliente para reduzir a ansiedade, notamos a ausência de
técnicas elaboradas conforme podemos verificar pelos seguintes trechos de
depoimentos:
Procuro
pensar em outras coisas, (...) procuro perguntar (...) o nervoso passa com o
tempo ... (c1).
Eu
pego a minha bíblia e vou ler, (...) fico na janela olhando a paisagem (...)
tenho um walkman que boto na rádio melodia ... (c2).
(...) fumar cigarro (...) nunca utilizei
outros meios para diminuir a ansiedade ...
(c3).
Procuro
me distrair com as crianças (...) gosto também de música, ela me tranqüiliza
...” (c4).
Nada,
fico calado, me isolo. (c5).
Segundo os dados obtidos, ainda que
as estratégias sejam simples, observamos que alguns desses clientes utilizam mecanismos
de enfrentamento do estresse positivo,
como a distração não dirigida (c1, c2 e c4), o que está de acordo com a
literatura estudada para diminuição da ansiedade.
De acordo com PIMENTA ( 1990 ) ,
distração pode ser usada como método não invasivo. O cliente que mantém a
mente ocupada pode diminuir a ansiedade.
Encontramos também a utilização
de mecanismos negativos como: o
tabagismo (c3) e o isolamento (c5).
A situação do cliente três denuncia a falta de uma abordagem sistemática que
conduza o cliente a comportamentos mais sadios. Um cliente no pré-operatório
de cirurgia cardíaca que administra a sua ansiedade fumando mostra que o
Sistema de Saúde falhou antes e
continua falhando uma vez que não houve alteração no comportamento e a
manutenção deste concorrerá para o fracasso da terapia cirúrgica.
Concordamos com WHITLEY ( 1992 ) ao
considerar que quando os clientes têm respostas adotadas que são mal adaptadas
e ineficientes, cabe a enfermeira ajudá-los na avaliação deste tipo de
resposta e na implementação de novos padrões de enfrentamento do estresse. No
nosso entendimento, o relaxamento muscular progressivo é um dos novos padrões
a ser adotado.
Durante a realização da técnica
de relaxamento muscular progressivo, observamos inicialmente nos clientes um
desconforto quanto à participação na sessão. Este desconforto ficou
evidenciado por uma elevação da freqüência respiratória e por uma inquietação,
dificultando a concentração dos clientes.
Para corrigir este desvio que já
era esperado, demos oportunidade ao cliente para concentrar-se e ambientar-se
por meio de música e de orientação. Desta forma foi possível alterar este
quadro, permitindo um melhor aproveitamento da prática de relaxamento muscular
progressivo.
Ao término das sessões,
verificamos que os clientes apresentavam uma diminuição da freqüência
respiratória considerável e uma expressão facial de tranqüilidade.
Foi solicitado aos clientes que
expusessem seus sentimentos à respeito da experiência vivida. Neste sentido, sensação
de paz, tranqüilidade, alegria e leveza foram os sentimentos e emoções
mais referidos.
Estes dados são confirmados e
validados pela literatura pesquisada (PIMENTA, 1990; TAYLOR, 1992; FRANÇA e
RAHM, 1984) .
Quanto à percepção
dos clientes sobre a técnica utilizada e a sua efiçacia, destacamos os
seguintes trechos dos depoimentos coletados após 48 horas da última sessão de
relaxamento.
“Na 1
eu não fiquei relaxado, fiquei preocupado em ouvir o que você estava falando,
mas na 2 eu já relaxei cada parte do corpo ... o que eu senti dificuldade de
relaxar meu coração, eu imaginava ele todo ruim ...” c1.
“Me senti bem ... , mais leve e tranqüilo,
... na 2 vez eu relaxei mais ...”
c2.
“Me senti muito bem, relaxada, senti o
corpo leve, não senti dor, foi ótimo ...”
c3.
“Me senti muito bem, otimamente, tenho
dormido que é uma beleza. Me senti relaxada, quase que dormi ...”
c4.
“Senti bem, gostei, ...”c5.
Os sentimentos acima referidos estão
relacionados na literatura especializada ( PIMENTA, 1990;
HERMOGENES, 1976; TAYLOR,
1992; FRANÇA e RAHM, 1984 ) reforçando
o efeito tranqüilizante desta prática.
Segundo HERMOGENES (1976 ) durante o
relaxamento, a mente goza a ausência do corpo, que está em grande inércia e
paz fisiológica, é como se estivesse ausente. As emoções se acalmam.
Verificamos que os clientes
conseguiram diferençar os sentimentos existentes antes e depois do treinamento
do relaxamento muscular, conforme os trechos a seguir.
“Antes de aprender eu ficava
ansioso e minha cabeça começava a rodar, pensava o que vai acontecer na
cirurgia, na anestesia, ... Agora começo a pensar em outras coisas ..., começo
a pensar positivo” c1.
“Antes eu estava mais ansioso ...,
agora depois que eu aprendi o relaxamento eu me sinto mais controlado ...”c2.
“Antes eu não conseguia dormir,
ficava preocupada, pensando no problema de operar ..., agora eu me sinto muito
bem, foço o relaxamento na hora que vou deitar ..., a gente dorme a noite toda
...” c3.
“Foi ótimo ... contribuiu com
muita paz, dormi muito bem, me controlo melhor” c4.
“Senti melhor depois que comecei a
fazer, a ansiedade, o medo é mais controlado ...” c5.
Os depoimentos revelam resultado
positivo quanto à obtenção do relaxamento da mente e do corpo pêlos
clientes. Cabe observar que a avaliação positiva dos clientes surpreendeu as
autoras, tendo em vista o número de sessões realizadas (apenas 02) e o local
utilizado, que não encontrava-se totalmente adequado.
Acreditamos que a aproximação da
autora com a clientela, levou a uma confiança e credibilidade na autora e
consequentemente na técnica, o que facilitou o desenvolvimento, a vivência da
técnica por eles, e o resultado satisfatório para ambas as partes.
SILVA (1987) coloca que, o
atendimento às necessidades emocionais do cliente hospitalizado é uma das funções
complexas da enfermagem.
Segundo HENRICHS e AIKEN (1971) , à
técnica de relaxamento deveria ser mais acessível para as enfermarias e
portanto mais efetivamente usada por elas.
Quanto à eficácia das sessões
para o controle da ansiedade, obtivemos os seguintes dados:
“... antes eu ficava tenso e não
sabia como agir para diminuir, agora eu tenho um caminho, quando estou muito
tenso procuro utilizar a técnica ...” c1.
“... me senti mais leve, tranqüilo,
menos preocupado ...” c2.
“... eu relaxei, consegui tirar o
pensamento de outras coisas ..., não pensa besteira e depois que a gente fez o
relaxamento eu não fiquei com mais medo da cirurgia ...” c3.
“... contribuiu com muita paz,
dormi muito bem, me controlo melhor” c4.
“Tiveram efeito positivo, outros
pensamentos melhores que a gente tem, dorme melhor ...” c5
Os dados obtidos corroboram a opinião
de QUIRONGA (1987), que considera a técnica de relaxamento como promotora da
auto-estima e da autoconfiança da pessoa em crise, despertando a criatividade,
a capacidade de concentração e de memorização. Por intermédio desta técnica
o cliente utiliza mais facilmente o método da resolução de problemas.
Compreendo que o interesse pelos
problemas emocionais dos clientes, a aproximação do enfermeiro, a retirada
destes da monotonia o qual muitas vezes se encontram, juntamente com a aplicação
de uma técnica relaxante, facilita aos clientes uma modificação no seu estado
de humor, enfrentamento de problemas e ocupação da mente de forma positiva, além
dos benefícios fisiológicos.
Durante a entrevista final, os
clientes quiseram deixar sugestões, refletindo assim o seu interesse pela prática
utilizada, tais como:
“Gostaria que esse trabalho que
você fez fosse rotina nesse hospital, que fosse permitido aos pacientes que
quisessem, a participação ...”.
“Espero que esse trabalho possa
continuar, aqui no hospital ...”.
“Era bom que esse relaxamento
pudesse ser feito sempre aqui no hospital para os doentes ...”.
CONSIDERAÇÕES
FINAIS.
Cabe lembrar que a ansiedade é uma
característica freqüente nos clientes de pré-operatório e que esta experiência
traz prejuízo para a saúde deles. É importante ressaltar a importância da
presença do enfermeiro no pré-operatório observando e identificando
sentimentos que precipite reações estressantes.
Com a realização deste trabalho de
pesquisa com clientes no setor de cirurgia cardíaca, utilizando a observação
participativa, pudemos verificar a expectativa e a
aceitação com o qual os clientes receberam estas práticas, nos
surpreendendo com o resultado final, mesmo com o número pequeno de sessões.
De acordo com os objetivos propostos
inicialmente e a análise dos dados, verificamos que a ansiedade
configura-se como diagnóstico de enfermagem em razão de não só da sua
identificação pela enfermeira, como também pela possibilidade de ser tratada
de forma autônoma por meio de técnica de Relaxamento
Psicossomático, por exemplo.
Porém, apesar dos resultados,
devemos levar em consideração algumas implicações da pesquisa tais como número
pequeno de sessões, pois mesmo esta tendo atendido aos objetivos propostos, não
deve ser compreendido como recomendação. Da mesma forma que a sala utilizada não
estava totalmente de acordo com a proposta, devido ser uma sala de exames de um
hospital universitário e única disponível no andar.
Vale refletir que se houvesse meios
que proporcionassem a prática freqüente desta técnica por eles durante o período
pré-operatório como: sala à disposição com ambiente facilitador, acesso às
músicas mais tranqüilas, profissional disponível e apto para conduzir ou
orientar o uso desta prática, teríamos uma diminuição desses sentimentos
estressantes por eles.
Referências
Bibliográficas
BULECHECK,
G.M.; McCLOSKEY, J.C. Defining and
validating nursing interventions. Nurs Clin of N Am, v. 27, n. 2,
p289-97, 1992.
DALY,
J.M. NIC INTERVENTIONS linked
to NANDA diagnoses. Iowa. Iowa Intervention Project, 1993.
MITCHELL,
L. Relaxamento básico. O método
fisiológico para aliviar a tensão. São Paulo. Martins
Fontes, 1983.
POTEMPA,
K. An overview of the role of cardiovascular reactivity to stressful challenges
in the etiology of hypertension. J Cardiovasc Nurs v. 8, n. 4, p. 27-38,
1994.
[1]Monografia
de final de Curso de Graduação em Enfermagem na Escola Anna Néry -
Universiddade Federal do Rio de Janeiro, dezembro de 1994.
[3]Doutora
em Enfermagem pela Universidade de São Paulo -SP. Prof. Titular do Deptº
de Enfermagem Médico-Cirúrgica da Universidade Federal Fluminense.
Pesquisadora do CNPq. Prof. do Curso de Pós-Graduação em Enfermagem da
Universidade Federal da Bahia. Coordenadora do NEPAE- Núcleo de Estudos e
Pesquisas sobre as Atividades de Enfermagem. E-Mail: MEMCRUZ@BRUFF.BITNET
Telefax (021)709-3522.
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BNN - ISSN 1676-4893
Boletim do Núcleo de Estudos e Pesquisas sobre as Atividades de Enfermagem (NEPAE)e do Núcleo de Estudos sobre Saúde e Etnia Negra (NESEN).